domingo, 24 de abril de 2016 | Filed in:
- “Não quero tirar o pijama, agora, vovó. Primeiro
vamos brincar com a nossa maquete, tá bom”?!!! – os olhos da pequena brilhavam.
- Tá... responde a vovó, vencida. O dia
acordara luminoso e belo, mas não mais do que aquela raio de sol, falando e
gesticulando, empoderada, na sua frente. E o imaginário tomou conta, de vez, na
cozinha...
- “Todos acordaram e enquanto a mãe prepara o café,
o Luca e a Martina vão brincar no parquinho!... Vovó, você é a mãe (da
maquete). Pega a “mãe”(boneco) e vai preparar o café; bem gostoso!!! Ah!
Melhor não fazer café... faça um chazinho! É mais saudável para o Luca e a
Martina! Não! Só para o Luca; a Martina é bebê! Ela só toma mamá...” – as
palavras iam jorrando... a vovó quase conseguia ver as ideias borbulhando naquela
cabecinha... as palavras não davam conta de expressar tanta coisa que passava
por ali...
As duas ficaram um longo tempo brincando com os
personagens da maquete que ambas haviam construído, ao longo da semana;
viajando no imaginário de uma e de outra, entre raios de sol madrugadores...
Isto já havia liberado uma porção de idéias, transformadas em histórias
mirabolantes, na cabeça e no verbo de ambas! Tudo sobre uma família que a
menina sugeriu: pai, mãe e dois filhos.
Os “filhos” (um menino e uma menina), a cada dia, mudam de nome. Hoje, eram chamados pelos nomes dos priminhos, vindos lá
do RS, que a pequena encontrara no dia anterior.
A “família” da maquete
mora num prédio, perto de outro prédio. Ali tem um parquinho, um mercado e uma
piscina para refrescar. Eles também têm um carro, para passear; ir na casa
da vovó e do vovô e dos tios. No parquinho, tem uma árvore que faz uma sombra
gostosa e dois banquinhos, para descansar.
- “Estou com fome, vovó! Pode me dar um queijinho
enroladinho no presunto? E um chazinho? Na xícara da família Bule”? -
pediu a pequena, de repente; saindo da fantasia e entrando na realidade
da barriga vazia.
A vovó arrumou a mesa, para o café, com três
lugares: para ela, o vovô e a netinha
- “Não acredito, vovó!!!! Você achou a sra Bule”!!!!
Não imaginava, a vovó, quanta alegria poderia
produzir, colocando à mesa, a família toda: o Sr Bule, a sra Bule e os
“filhinhos” deles! Há alguns dias atrás, na hora do chá, não haviam encontrado
a sra Bule (certamente alguém que lavara a louça, guardara em outro
lugar) e menina ficara muito triste, contentando-se, então, com o Sr
Bule. Fazer o quê, né?!!! Mas, inesperadamente, o casal estava junto,
hoje, no armário!
Sr e sra Bule! Foram anistiados, depois de um longo exílio
no mais fundo do armário, pelo olhar curioso e mexeriqueiro da pequena, um dia... Vale relembrar:
- "O que é isto vovó"?
- Ah! Louças que a vovó ganhou de presente de
casamento, muitos, muitos anos atrás...
- "Por que estão lá no fundo"?
- A vovó guardou, de lembrança... é que só sobraram
estas; as outras quebraram com as mudanças...
- "Eu quero ver, posso, vovó"?
Resgatadas e ressignificadas como "Família
Bule", as louças passaram a fazer parte dos encontros entre avó e neta.
Um dia, como já foi dito, a sra Bule sumiu...
Mas eis que hoje, ela retorna! A emoção foi
tanta que derramaram chá e outras coisinhas na toalha! Mas só riram! Sem
bronca. Imagine! A sra Bule voltou! Que coisa melhor do que isto? Quem vai
ligar para uma “sujeirinha” na toalha, nesta hora?!!!!
O chá, dentro do Sr Bule, fumegava, “pelando” de
quente! A pequena estava ansiosa. A vovó serviu o chá numa xícara
pequenina, numa das filhas do casal Bule; esfriou e liberou para a netinha para
tomar...
- “Ah! Delícia, vovó”!!! – elogiou a pequena,
estalando a língua; boa tomadora e admiradora de chá que é.
- “Vovó, agora põe o chá do Sr Bule na sra Bule; daí
eu posso servir você e o vovô... A sra Bule é pequena, eu consigo
segurar”... – pediu, decidida. – “Eu sou cuidadosa, vovó”!
Xícaras servidas, o brinde, antes de beber! Sim,
porque antes de beber qualquer coisa, quando estão os três juntos, é preciso
brindar! Uma exigência da pequena, que sabe-se lá onde viu e “pegou” a ideia.
Delícia de chá! Delícia de momento!
- “Pelas primas! Pela saúde! Pelas festas e pela sra
Bule: TIM,TIM”!!!! – comandou o brinde, a neta, diante do olhar comovido dos
avós babões!
E, meu Deus! Seria só uma “imaginação não comprovada”,
como diria o "biso Ico"? Ou miragens provocadas pelos olhos embaçados
da vovó? Ou a vovó viu, de fato, a família da maquete também tomando o seu
chazinho, embaixo daquela sombra deliciosa... e o Sr Bule dar uma piscadinha
para a sra Bule e, ambos dar uma “cutucadinha” nos filhotes xícaras, que rebolaram
e riram baixinho?!!! Sabe-se lá... Mas que o sorriso da menina estava faceiro
demais, sinalizando mistério, confabulações, estratégia, pura cumplicidade,
magia, encanto ... ah! Estava!
Permitindo-se o momento, a vovó tomou-se de
gratidão! Numa hora destas, não tem como não redescobrir a alegria!!! Um dia
que começa assim, não tem como não ser belo, motivador, cheio de
possibilidades! A vida não tem como não ser especial, bonita... valer a
pena!
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