domingo, 17 de abril de 2016 | Filed in:
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Quem descobriu o Brasil? – perguntou o índio Fulni-ô.
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Pedro Álvares Cabral! – respondeu, na ponta da língua, o aluno, pequenino, emocionado.
Os alunos maiores trocaram olhares cúmplices entre si, mas deixaram, respeitosamente, por conta do "chefe indígena", o esclarecimento.
Os alunos maiores trocaram olhares cúmplices entre si, mas deixaram, respeitosamente, por conta do "chefe indígena", o esclarecimento.
E o índio, acompanhado pelo olhar dos três filhos, balançou negativamente seu
indicador direito, deixando a platéia num suspense... fitando, com muita
atenção, cada criança e
cada adulto ali presente... e completou com palavras firmes mas tranquilas:
-
Isto é o que muita gente aprendeu nos livros de história... mas não é a verdade!
Quando os portugueses chegaram no Brasil, não havia ninguém por aqui?
Todos
sabiam:
-
Sim, havia! Os índios estavam aqui! – responderam, bem forte, as crianças.
-
Isto! Nós, os índios estávamos aqui. E não éramos poucos. E habitávamos todas
as partes do Brasil.
O
silêncio era respeitoso e intenso.
E
neste silêncio, neste vazio de palavras, eu mergulhei mais fundo do que tenho
mergulhado... Uma história contada por um olhar ou somente por um dos lados dos
personagens envolvidos; no mínimo, é omissa. Os índios nunca foram vilões.
Tanta gente brigando, defendendo suas terras, propriedades, direitos... alguém
tem o recibo de compra passado pelos verdadeiros donos da terra? O desrespeito,
preconceito, a ganância, a soberba e a corrupção deixaram um rastro imenso de
sangue, injustiça, hipocrisia e morte na nossa história ... que continua se alastrando e engordando nos
nossos dias.
Os
índios estão quietos, ou parece. É quase como se não existissem; a não ser quando
lembrados nas datas comemorativas; como tantas: “dia disto e daquilo”; quando
se “vê” apenas um lado, o lado que convém a quem comanda\dirige; ou o bonito, o
ideal (que não nego, nem desmereço), ou quando alguém se pronuncia sobre; ou quando acontece um incidente que corajosos denunciam, mas que poucos atentam. Somente aqueles que têm interesse, que estão solidários com as minorias, que
pesquisam, procuram saber ou que trabalham ligados às nações indígenas, no
cotidiano, sabem como é de fato, a real situação destes legítimos filhos desta
terra. Muitos de nós, ignorantes, os consideramos preguiçosos, vagabundos, ladrões,
etc, etc. Já ouvi muitas destas expressões; cheias de menosprezo, menos-valia...
Assim como rotulam os “sem terra”, os “sem outras coisas” e aqueles que não
concordam com eles ... Jogam, os “donos da verdade" e seus narizes empinados, como se diz por aí: "tudo e todos no mesmo saco".
Um
aluno, depois do encontro, falou:
-
“Mas professora, se eles não têm mais o rio sadio para pescar, terra boa para
plantar e se o artesanato dá pouco dinheiro, porque eles não vão trabalhar nas
lojas, nas cidades”...
Isto
me apaixona, na educação: o espaço para questionar, conversar, pensar, esclarecer, orientar! E a espontaneidade, a confiança das crianças para expressar o pensamento, sem censura prévia! Gostei
da pergunta. Oportunizou o aprofundamento destas questões que cotidianamente, estão
presentes na nossa lidança: as diferenças! Ah! Parece tão simples... mas não
é! Reconhecer e respeitar o jeito diferente do outro pensar, agir, sentir,
viver, trabalhar, interagir com o semelhante e com a natureza, amar... demanda muita conversa, escuta, troca,
amadurecimento, generosidade...
O
índio Fulni-ô pai, vindo do sertão de Pernambuco, falou que gostava de estar ali, conosco (esta era a segunda vez), onde era bem recebido. Relatou que isto não acontece
em todos os lugares. Recordou um fato, num lugar, outra região, onde foram
ridicularizados pelos alunos, que lhes jogaram bolinhas de papel, durante o
encontro... Gente! Gente! O que está
havendo conosco?
É
difícil viver e educar num cenário maniqueísta. Há muita coisa entre o 8 e o
80! Muita! Muita! Puxa vida!
Dançamos
juntos! E na dança, não éramos índios, brancos, negros, alunos, professores,
crianças, jovens, adultos... nem de “direita” ou de “esquerda”... Éramos gente!
Que partilhava espaço, vida, momento, prazer, alegria no compasso da melodia! E
gente diferente! Igual a qualquer gente, em qualquer lugar neste chão, neste
planeta!
Oh!
“Quem poderá nos salvar” e acabar com estes desencontros desastrosos?
Desconfio
que eu e vocês: nós.
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