"Filosofinha"


- “Vovó! Tem umas coisas tristes, mas eu acho que Deus deixou a vida bem arrumada”!
       - É? E que tipo de coisas você acha que Deus deixou bem arrumadas?
       - “Ah... coisas... tipo... as poesias! As continhas  de  mais e de menos! As brincadeiras! As comidas! As coisas  da  natureza...”
       Penso que por estes tempos, ninguém mais se atreve subestimar as crianças, seu olhar, suas percepções, suas hipóteses e reflexões. Uma escuta atenta e a convivência com elas surpreende, sensibiliza, humaniza e nos presenteia com a oportunidade de rever, reorganizar,  alegrar e ressignificar a vida!
      

O "fazerista"



      Eu observava a dupla. A conversa fluía. Assunto nunca falta na interação da pequena com os dindos. Num momento, enveredou para ofícios, profissões e o dindo perguntou:

       - O que você acha que eu sou?

       A pequena, sem pestanejar, no ato:

       - Acho que você é um “fazerista”, dindo!

       Claro! Nada mais apropriado para este dindo que se encontra mais próximo, fisicamente, sempre fazendo coisas inusitadas, especialmente para ela! A lógica infantil é maravilhosa!

       Amei o vocábulo! Corri para anotar. Estas coisas lindas a gente não pode esquecer, perder! É bonito demais! E sério, importante.

       Depois do riso, dos comentários, do encantamento, da ternura e da palavra anotada, ficou a reflexão...

Com exceções e por falta de cuidado, o cotidiano  tende tornar-se repetitivo, massificante, azedo e áspero.  E nós nos fixarmos nisto que mais aparece, que salta aos olhos: muita cópia, muita receita, muita falação, muita pressa, muita pressa... modelos e metas; generalização e banalização. Solidão. Doença. Superficialidade. Comodidade. Olhar desencantado, sem brilho; coração sem compaixão e sem escuta. Mau humor, má educação, falta de caráter, oportunismo.

       Mas, por outro lado, quando há resistência à masssificação, ao assujeitamento e encontramos com os intervalos para respirar, olhar e escutar; deleitar com as “fantasticidades” ao redor; a natureza e suas criaturas (e entre elas, nós e nossos talentos; nossa alma criança!) nos reconhecemos! Nos reordenamos! Desconstruímos muros, resgatamos nosso riso, nosso brilho, nossa motivação, nosso sonho; arejamos nossa casa e nossa cabeça! E promovemos encontros! E belas construções!

Observo, sim, que antigas e novas profissões e ofícios são exercidos nas entrelinhas, sem o aval das universidades. Assim como outros que são necessários por estes tempos, para dar conta do que nos faz falta! A sensibilidade e espontaneidade das crianças, a dor e a solidão dos velhos, a esperança e a inquietude dos jovens e o desejo dos adultos implicados com seu fazer e com a cidadania, sinalizam quais os ofícios que necessitam, urgentemente, de extinção porque já estão excedentes: os golpistas, "os umbiguistas", os machistas, “os marias-vão-com-as-outras”, etc... e quais os que demandam ser oficializados ou ressignificados. Não fiz a pesquisa mas estou tentada, encorajada pela palavra da minha neta, a fazer, despretenciosamente, uma busca e uma listagem dos “ofícios” maravilhosos exercidos por aí e ainda sem quesitos, pré-requisitos, carga horária e currículo. E, afoita como sou, abro minha lista com a sugestão da pequena:

FAZERISTA: aquele que faz “mil coisas” úteis e divertidas.      

        


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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