Um momento dentro de outro

A tarde, ontem, num momento bem preciso, estava com o gosto, o cheiro, o frio e o vento das tardes frias dos invernos da adolescência, quando, com minha mãe, visitava a casa das tias, para o mate. A mãe e suas irmãs eram muito unidas e o mate girava, cada semana na casa de uma delas. Gostava de ficar ali, entre aquelas mulheres simples, ouvindo suas conversas, observando suas mãos calejadas, seus rostos de traços bonitos, marcados pelo tempo e por uma melancolia que sempre me inquietou. Elas despertavam minha ternura e curiosidade. Eu achava que eram solitárias. Umas eram mais risonhas, outras mais duras e sérias e outras mais caladas e tímidas, como minha mãe. O mate circulava e com ele, bolachinhas e cuca. As conversas giravam em torno de coisas da casa: quanta roupa lavada e passada; como estavam os filhos e os maridos; quando então o volume da voz baixava e alguns códigos apareciam e eu sabia que a conversa não era para “crianças” e fazia de conta que não prestava atenção. Eventualmente, acontecia um comentário sobre algo inusitado;  uma fofoca, algo referente à  novela que passava no rádio; um sonho de consumo... Gostavam de recordar. E eu gostava destas recordações, fazia muitas perguntas e elas, enquanto me contavam coisas do passado, da época em que eram crianças e depois mocinhas; riam muito e os olhos brilhavam! E eu ficava feliz pois descobria que elas, um dia, tinham sonhado com coisas  que naquele momento, eu também acalentava. Isto me aproximava delas... Ao mesmo tempo, temia que os meus sonhos, assim como os delas, não se realizassem nunca. Eu gostava daqueles momentos, de estar naquele universo feminino, imaginar que um dia eu seria como elas e conheceria todos estes segredos que envolviam o ser uma mulher adulta e que estimulavam minha imaginação... Estas recordações todas vieram de repente! Tão rápidas e tão vivas quando fechei os olhos  para saborear o contexto; na casa de uma amiga! As tardes do passado misturaram-se com esta tarde do presente e eu senti como se estivesse, outra vez  lá e, ao mesmo tempo ali, no ateliê dela, também um universo totalmente feminino. Ela trabalhava nas suas encomendas de patchwork e eu tricotava uma touca para minha neta. Em meio aos silêncios respeitosos, necessários ao fazer de cada uma e às particularidades preservadas; aconteciam as trocas de confiança. E havia o café... E uma doce sintonia entre nós duas, mulheres tão diferentes mas com inquietudes, observo, que assolam o feminino “desde que os tempos são tempos” ou “desde os tempos de dantes”, ou “desde que o mundo é mundo’... e as mulheres estão por aqui... Que fantásticas são as lembranças! Como numa fração de segundos a gente pode se reportar ao passado, como se ainda estivesse lá, sentindo na pele a temperatura daquele exato momento; percebendo o balançar das árvores e o cair das folhas, os cheiros e expressões dos olhos, os tons de voz... como se um tempo estivesse dentro do outro, o tempo todo... Bom experimentar isto!

Férias

Delícia das férias
é acompanhar
o tempo que passa!
Sensação
de abertura,
infinitude diante
do que é, do que há,
do que é possível!
Coração palpitante
e  olhar de criança
que aguarda e vê
uma bela surpresa
chegando a todo instante!

Amor-te

  Imagem de Elcio Limas
O dia chega curioso
e inocente, todos os dias;
desejante!
Indiferente a quem
vêm a tiracolo:
a vida e a morte
na luz e na sombra
de mãos dadas,
quase  abraçadas!
Dormir, perder e sofrer
é morrer,
mas também é sonhar,
crescer, viver!
Não ver, estar longe
é morrer.
Mas ver , estar perto
e não interagir,
não poder expressar
o sentimento, também.
Escolher é morrer,
mas também maturar,
dar outra chance
ao viver.
Criar, falar, amar
é viver;
mas para não machucar,
por vezes, precisa morrer.
Morrer para o que faz mal
é viver!
Enquanto que, viver à margem
é morrer!
Assim que viver,
pode significar morrer
e, morrer,
ser livre e viver!
O sol, cúmplice
indiferente às diferenças,
segue, justo, paciente
no seu ofício cotidiano
desafiando:
viver em profundidade é
“morrer de felicidade”!
“Amor-te”!

Forte

    Imagem de Elcio Limas
Amor e  alegria
acordando dentro da gente,
é sol que chega
no horizonte,
tomando espaço
cativante, forte
deslumbrante!
Energia, vibração
      calor que invade,  
areja, colore
enche de sabor
o que dormia!
Tudo torna brilhar,
o fazer e o olhar!

Cinza...


Ver o mundo
através das folhas
de um coqueiro...
aos poucos,
conforme a luz
abre passagem
por entre elas...
Ver em partes
depois por inteiro
ou ao contrário...
Interessante!
Brinco, no espaço
restrito da janela
enquanto o dia
inteiro, lá fora,
vestido de pijama cinza
como eu, me fala que
o pesar e o nublado
têm seu significado,
que estamos juntos,
logo passa!

Acalento

A chuva  cantava baixinho  junto ao telhado e às  calçadas... O calor do fogão à lenha aquecia a cozinha, na manhã fria e o aroma do chá impregnava o ambiente com seu perfume suave... uma combinação rica de elementos que  ativaram a memória dos meus sentidos; trazendo para bem perto a cara da saudade; tão intensa e esmagadora como ela sabe ser. Só colaborei acrescentando uma música, o que ativou ainda mais as percepções e aprofundou o que já estava evidente. Saudades explícitas, do agora, do que posso nomear e outras que se perderam no tempo; deixando somente marcas e espaços vazios, que não sei nomear, apenas sentir. Dias, momentos assim, recorrentes, me fazem buscar alguma coisa concreta para reorganizar o interior e continuar, “apesar de”. Hoje busquei apontamentos de um livro raro, que um dia acessei. Ele conta a história de um amor intergaláctico e sua trajetória atravessando tempos, eras, idades, civilizações e seus encontros e desencontros neste percurso... lindo, no sentido mais íntegro da palavra, embora, para muitos, sei, isto se configure como piegas e ilusório! Me encanta profundamente uma frase, no prefácio, tão simples, mas tão impregnada de significantes: reportando a um tempo “...quando homem e mulher uniam-se por puro amor,  para criar,  para fazer o bem aos semelhantes...” ; algo que parece tão longe e ao mesmo tempo tão perto; tão absolutamente possível, quanto absurdamente improvável... palavras, expressões que se esvaziaram, mutaram, mas que neste meu momento, agora, acalentam. 

Cuidar

Tudo precisa de cuidado:
Criança
planta
pedra
terra,
água
bichinho
jovem
adulto, velhinho.
Falta de  cuidado
faz estrago.
Tudo tem alma
função
sentido
beleza;
tudo precisa de carinho!

Noite

    Imagem de Elcio Limas

    Noite...
aconchegante e misteriosa
vestida de quietudes e inquietudes
sussurros, exclamações
e silêncios de amor
fragilidade e beleza...
Tesouro escondido
que se encontra ou não
mergulhando nas incógnitas
do sono, da insônia, do sonho
das presenças e ausências,
daquilo que se encobre
com o manto das sutilezas
para se tornar presente. 

Desencontro



Mais um pouco,
adiante de minhas
próprias reticências,
uma palavra correndo
atrás do sentimento,
sem perspectivas
de encontro.

Na roda...


Dias ensolarados e luminosos
têm muita ânsia de viver!
Belos e inquietos!
por vezes egoístas,
se mostram e se entregam,
apaixonados, exigentes
e sem cuidados!
Desconhecem
a cumplicidade e  aconchego
dos outros dias, os sutis
e encabulados...
que se sucedem na delicadeza
e singularidade do  tempo;
sem pressa, sem  correrias...
generosos, ponderados!
Ambos se alternam
na roda dos dias.
Ecoam dentro de mim.

Trabalho em grupo

Pena que o programa Globo Rural, na TV Globo, não vá ao ar num horário nobre. Casualmente, aos domingos, vejo um e outro quadro. E o que tenho visto, tem me surpreendido: reportagens interessantes, mostrando as articulações, superações de pessoas, pequenos grupos, comunidades, visando o bem coletivo (que evidentemente também passa pelo individual).  Hoje, assisti uma reportagem sobre um lugar: Palmeira (ES). Eu me emocionei com o fazer daquele povo e com a consciência que já têm e aprofundam, de trabalho conjunto e de como isto, na medida em que se associa ao conhecimento, gradativamente traz benefícios à comunidade e melhora a qualidade de vida das pessoas.  Particularmente, fiquei tocada com o depoimento de um cidadão falando sobre o trabalho exaustivo que tiveram para livrar o rio do esgoto e devolver a ele, a qualidade da água. Ele falou que tinha vergonha de ver o rio poluído, mas não sabia muito bem o que fazer. Depois, encontraram uma solução, em grupo! Ele também mostrou-se bastante emocionado narrando a experiência ao repórter!  Falou que isto tinha sido possível porque nós somos capazes de transformar... se quiser, o ser humano é capaz de transformar”. Falou com orgulho, com conhecimento de causa, com sentimento de “dever cumprido”.  Destaco, outra vez, estes dois grandes momentos que ele viveu e partilhou na sua fala: como sentia-se antes: envergonhado! E como sentia-se agora: acreditando no potencial criativo e construtivo do ser humano! Nossa! Isto ficou ecoando e provocando meu olhar e minha reflexão; além da admiração... estimulando a vontade de saber, comentar, valorar e espalhar estas e tantas outras coisas boas que acontecem por aí e que nem sempre têm o destaque que merecem.




Mar de sol

No crepúsculo,
o sol reinava seus últimos momentos
esparramando os  “ruivos e longos cabelos crespos”
pelo céu, num contraste impactante com o doce azul... 
Parecia que havia um mar de sol, no céu!
Um cordão longo e vivo de pássaros,
em sincronia, dançava neste cenário,
em linha reta, em círculos, em espiral...
subindo, descendo...
Parecia uma “rabiola de pipa”,
livre e feliz rodopiando nos braços do vento,
sem medir tempo!
Era tão bonito que doía!
No entardecer belíssímo
na estrada, encontro com a melancolia!
... porque justo  naquele instante
estava distante de tudo,
de todos que mais queria.
A beleza era tanta que doía! 
Tanto amor, naquele momento,
sem endereçamento,
tornou-se um peso, um lamento
silencioso, arrebentando entranhas,
sufocado, dentro.

Laços

         Imagem: Elcio Limas
Diferentes, mas solidários e cúmplices. Companheiros de sol, de chuva, de  rotina... e de sina. Um dia, desconhecidos e já num outro instante... algo comum tece um laço!  E um laço forja outro e outro... Assim  se encontram e encontram virtudes e afeto, um no outro... E partilham  risos,  confidências, abraços, lamentos e silêncios... o  peito sempre como se fosse explodir com esta alegria íntima de ter, saber e contar com o outro! Meus alunos, no último dia de aula deste semestre, aprendizes e mestres numa mesma moeda, disseram-me que “para ser amigo, companheiro, é preciso ser tolerante e respeitoso”... claro! As crianças percebem logo: é a essência que vale! Aparências não sustentam nada e é o respeito quem cuida das coisas que valem a pena, como a amizade, um amigo! O  que cativa e mantém o afeto e valora a diferença é o que temos de verdadeiro, dentro, na essência! É o que vê beleza, esperança, singularidades. Que exalta! Acredita no potencial, naquilo que talvez ainda não apareça, mas que está latente, descansando entre os braços protetores daquele que cuida... É o que extrai fruto e flor. Produz viço, brilho! Perfume.

É possível aprender?

... aprender sobre  diferenças
por vezes tão sutis
na interpretação ou na ação:
autoritarismo e permissividade
autoridade e negligência
doçura e passividade
fé e ignorância
amor próprio e egoísmo
silêncio e indiferença
franqueza e grosseria
Ideal e obsessão
respeito e medo
dedicação e escravidão
liberdade e abandono
espontaneidade e infantilidade
verdade e hipocrisia
Invadir e se importar
educar e adestrar
amar e aprisionar...
Puxa! 
Não é mole, não (!)
o que o viver
exige da gente...
Dia de chuva é assim
não dá para fugir de mim!

Vive!

Pula! Pega!
Rola! Joga!
Bola, pião
amarelinha...
Lá e aqui
aqui e ali
ali e acolá...
Pula a barreira
pega teu sonho
rola teu riso
joga teu medo
agarra o tempo feliz!
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                    

Mãe...

Oh, Mãe!
Suave e bela
de repente te iluminas
na madrugada
e de dentro da gruta
diriges tua luz  para mim...
como braços que
chamam e acolhem
incondicional
na escuridão da mata
nesta cegueira sem fim...
Não me perderei, sei!

Rubor

  Imagem: Elcio Limas
O sol  brota no horizonte
ou detrás dos montes,
abre um sorriso...
e oh!...  A terra  estremece!
De prazer!
De emoção!
De amor!
Um rubor de felicidade e calor
aviva os verdes
tonaliza os coloridos
potencializa as sementes
e se espalha pelo mar, pelo céu...
invadindo os campos, becos e ruelas!
Extraindo  suspiros,
suscitando melodias e poesias!
Assim também 
me invade o sol
dos teus olhos
da tua fala
do teu sorriso...
e oh!... Eu estremeço!
De prazer!
De emoção!
De amor!!
E um rubor de felicidade e calor
aviva meu desejo de viver
potencializa o que sou.

Não engula o choro!

Tem até livro com este nome. Sabe-se que é algo não recomendável dizer. E nem fazer! Nunca! Com ninguém e muito menos com os pequeninos! Choro trancado é como rio represado. Sofre e um dia arrebenta, invade, faz estragos. A natureza do rio é correr seu curso, livre! Ele deseja isto, precisa disto. O choro também. Má educação, falta de respeito, birra, não se corrige nem resolve engolindo o choro. São lidanças diferentes. Manha ou não, o choro sempre está dizendo algo que a palavra ainda não alcança. E enquanto não tem a palavra, o choro é meio de comunicação. Duro é agüentar o choro; principalmente aquele que não explica, não traduz. Para decodificar, precisa atenção, respeito, acolhimento, sensibilidade... Porém, chorar alivia, até cura! Organiza. Conforta. Humaniza. Engolir, represar o choro produz problemas, sintomas; o contrário, não! Por vezes, no cotidiano escuto: “profe, o fulano disse que eu sou “chorão”.... Eu  pergunto: “e você é”? Ele admite ser. Então eu digo: “então está tudo bem”! “Eu também sou chorona e daí? E daí que você é chorão?  Cada um é como é”. Viver em profundidade as emoções é saudável. Viver a frustração, os lutos, as raivas, os medos e as inseguranças que surgem no cotidiano da vida... Vejo que isto  é que fortalece. Amadurece. Não é forte, aquele que foge, não se permite, reprime, esconde, passa “por cima”. “Homem pode chorar, né profe”?!  “Claro que pode! Deve”! – respondo e asseguro. Choro minha emoção e minha alegria! Minha saudade, minhas culpas e medos. Minha dor e meu amor. Minhas bobagens e meus sonhos evaporados!  Choro engolido não é engolido: é choro travado. E o que está travado não anda. Não engula o choro!!!

Calçadão



O calçadão ladrilhado
era um longo jardim
florido de sol e mar
de luz e perfume!
Passava,  na  hora
e no seu passo,
velho, criança e bicicleta
moça bonita e namorado
cachorro, dona, atleta...
... energia, sabor,
leveza e cansaço!
Com certeza,
no momento da luz
mais bonita do dia
passamos eu,  
embriagada desta beleza
e Maria, que dormia,
sonhava e ria.

Parceria

   Imagem de Elcio Limas
Parceria
tem par
tem ar
tem riso!
Parceria sossega
relaxa, inquieta,
provoca... depois
cura tudo num 
num beijo, num abraço
num sorriso!
Tantas... como 
entre nuvens e morros
acordando abraçados
na manhã nascente...
Parceria entre
córregos e peixes
brincando pelas corredeiras
na tarde quente!
Entre madrugada e orvalho
refrescando, gota a gota
pedra, folha e flor!
Parceria de alegria
entre o sol e as cores
brincando de rabiscar o céu!
Parceria...
entre amor e melodia!
Entre olho que contempla
coração que sente
mão que escreve!
Entre  ideia,
suor e vontade!
Entre o que  escuta
e o que fala...
o que acarinha e
o que se entrega!
Parceria, maravilhosa!
entre aquele que sonha
e aquele que cria!

Sombras

Sombras da noite...
braços gigantescos
silenciosos
e cúmplices
que estreitam
num abraço
de quimeras,
onde me perco
e me encontro.

Casa da vó


A “casa da vó”, agora, é a minha. A avó, agora, sou eu! ...Um dia, foi a casa da nona Virgínia (minha avó materna italiana) e a casa da vó Aurélia (paterna, alemã). Na casa da nona Virginia havia cadeira de balanço, chá de mate, polenta e conversa alta, riso solto... e um pé de romã! Eu me encantava com ele e com a fruta que produzia! Nunca mais eu vi um pé de romã... A nona era um pouco triste... Mas havia o nono!  Que contava “causos e causos” de “dantestempos” (que eu adorava ouvir!), balançava e atirava a cabeça prá trás, rindo sua gargalhada gostosa! Na casa da vó Aurélia, havia mais silêncio... a vó era séria. Costurava e fazia um “chiadinho” que me intrigava e encantava ao mesmo tempo... Ela me ensinou fazer crochê! Tinha sempre por perto umas revistas; eu era curiosa e ela me dizia que eram histórias, romances escritos em alemão. Tinha sempre um doce para oferecer! O vô era tímido e amoroso; gostava muito da gente; fazia cavalinho com as pernas cruzadas! A gente adorava! Os natais e finais de semana eram geralmente passados na casa deles. O tempo passou e a casa da vó passou a ser a casa dos meus pais: o vô Ico e a vó Ica (assim “batizados” pela minha filha, a primeira neta)... A vó Ica, (na verdade Ottilia), trabalhadeira, literalmente uma formiguinha; prestativa e cheias dos horários e regras! O vô Ico, uma figura rara, rara! Invariavelmente, os domingos eram momentos de encontro ali, na cozinha (nos dias frios) ou embaixo da parreira (nos dias de calor). Sempre a reunião em torno da comida: geralmente churrasco, salada; ou  carreteiro, lazanha, arroz de forno, “galinhada”... e aos doces da vó; nunca de um só tipo! E tudo regado a muita conversa, confidências, “lacaices”, ao riso frouxo e amoroso do Cuti, aos tons exagerados e hilários do João ( “rei da Glória”), às falas ponderadas do Marco; (meus três irmãos queridos), às  nossas recordações da infância, planos para o futuro, troca de pontos de vista... eu não sei como meus irmãos me viam no contexto, mas adorava e ainda adoro vê-los (quando isto se faz possível), ouvi-los nos seus posicionamentos e me chamarem de “Tata”! Ainda sou a “Tata” e isto é melodia aos meus ouvidos... Olhando para minha mãe\vó, toda esmerada, cheia de tempo e regalos para os netos, eu pensava: “não serei uma vó como minhas avós e nem como minha mãe, quando chegar minha vez...! Não sou habilidosa nos quitutes! Terei que descobrir um outro jeito de ser avó”... Agora, já chegou minha vez: sou a avó! É na minha casa que os encontros dominicais acontecem. Nem sempre com  todos, mas no mínimo com dois dos meus três filhotes queridos, queridos!!! Na casa da vovó Maisa tem historinha, tem cantoria; tem muito abraço e beijinho; tem muita árvore, muito verde, balanço, passarinhos, peixinhos e gatinhos e  de quando em quando, outros bichinhos do mato...  E quando a Maria e outros netos (que por feliz ventura, um dia vierem) ficarem maiorzinhos, encontrarão giz de cera, muito papel e lápis para desenhar, pintar e escrever!!! Mas fiquei pensando que isto não basta! Vovó parece que tem que saber fazer uma comidinha gostosa! Na casa da vovó parece que tem que ter aquele cheirinho aconchegante que vem do fogão... Então estou me esmerando! Nas sopas! No refogadinho de legumes! No arrozinho integral, na lentilha e no feijão. E, na canjica!!!!  Acho que dá para começar! Ninguém está reclamando! Pelo menos, de quando em quando, isto se torna um regalo!!!

"Apurando" percepções

Nosso corpo é algo fantástico! O funcionamento e as especificidades de cada órgão é de “encucar” e a sincronia entre eles, então... No momento, me (re)encanto observando (depois de tanto tempo) como um bebê se descobre, se percebe e aprende  a interagir com o ambiente e com o outro. E, na escola,  pesquiso, com uma turma de alunos, sobre  “percepções sensoriais”. É muito bom! Muito bom (re)descobrir as coisas através do olhar, hipóteses e compreensão das crianças! Os nossos órgãos dos sentidos são sensacionais! Nos fazem singulares! Como cada um pensa, elabora, constrói a partir do que vê, toca, ouve, cheira, degusta.... ou do que não vê, não toca, não ouve, não cheira e não degusta. Claro que as coisas não iriam ficar só nisto! As crianças são muito “antenadas, ligadas” e as informações chegam a elas rápida e facilmente e assim,  estamos adentrando, agora, no contexto das “percepções extra-sensoriais”! É interessantíssimo o que eles trazem, o que têm para dizer! E a escola é justamente este espaço para oportunizar e valorar a conversa, o pensar, o expressar... Depois das pesquisas e trocas, as produções de textos! Minha paixão! Até o momento, trabalhamos os títulos: “Cheiros que eu cheiro”,  “Gosto de quero mais”, “Por que esta boca tão grande”?, “Com os meus olhos”... Tenho desejo de repartir um pouquinho estas coisas (frases de um e de outro) lindas, singelas, espontâneas! Sutilezas que fazem tão bem à alma! Olha só:
A boca grande “é para falar bobeira e comer besteira\ é para passar batom e comer bombom”...  “tenho medo de que com esta boca tão grande\ possa engolir o oceano\ tenho que ter cuidado\ com um sopro, posso criar um tornado”... “esta boca dá risada, é abobada\ essa boca fala e é narradora”...  “o fogo queima\ está vermelho\ sinal de que o churrasco pode chegar\sem hora para acabar”; ...  “o meu gosto de quero mais\ é a comida da mamãe”... “faço manha\ por uma lasanha”...  “como é bom e gostoso\ poder sentir esses cheiros\ de mãe, casa e comida”... “os cheiros que eu cheiro\ são do meu quarto limpinho\ do pijama da minha mãe”... “na minha casa\eu sinto o cheiro de lar”... “sinto o cheiro\da família que sempre está por perto” ... “sem o nariz, não ia\cheirar nem uma florzinha\ bem pequeninha\nem uma rosa \tão cheirosinha”... “...o cheiro da flor do maracujá\ também o cheiro da melissa\quando a vovó faz o seu chá”...  “com os meus olhos\vejo uma flor, linda e maravilhosa\e também leio poesias”... “vejo amigas, vejo formigas, vejo amor e vejo flor”... “vejo um trovão e fico alucinada\vejo meus pais, que são legais”... “eu vejo o horizonte, cheio de fontes”...“eu adoro meus olhos, sem eles eu não ia ver as maravilhas do mundo”...

Aurora radiante!

     Imagem: Elcio Limas
 Aurora radiante!
Única!  Todo  dia!
Promessa de vida,
força e alegria
emergindo
forte, vibrante!
Todo dia...
revelando formas
sentimentos, nuances!       
Todo dia aquecendo,
fora, dentro,
no centro... pulsante!
Todo dia...
acarinhando superfícies,
germinando desejos,
colorindo esperanças...
Todo dia!








Tardes recém-nascidas

Encontrar e conhecer as tardes bonitas e longas, no calçadão, feitas de todo tempo do mundo, de brisa, de cheiros e de azuis é bom demais! Junto com Maria! Apresento a ela o mar, as gaivotas; a mansidão das ondas, cantando sempre o seu movimento... ontem, eu só ouvia My way... e meu coração planava... Mostrei um barco! Havia um ali... entregue e solitário, ninando, na beira da praia, suavemente, acho que uma porção de aventuras e sonhos e histórias que jamais saberemos, mas que estavam ali, bem visíveis  na sua  solidão preenchida. Eu gosto de adivinhar estas histórias... Raios de sol, escapando por entre a plantação de edifícios, coloriam, aqui e ali, partes do mar, da areia, das árvores e do rostinho da Maria! Sua presença e seu sorriso, provocam mudanças em mim e me  apresentam um mundo novo dentro do mundo velho, que eu redescubro, experimento, com olhar curioso e feliz! Laços e lembranças e sentimentos e esperanças que se tocam, tecem, interagem, aquecem... fortalecem!

Dia de eleição



Segunda-feira: dia de eleição na sala de aula. Escolha do lider da semana. Muito interessante este exercício! Adoro ver como o processo avança, qualifica, sem que eu tenha que interferir o tempo todo! Adoro ver como se desafiam, amadurecem e como o desejo de ser líder vai, com o tempo, sendo mais forte do que a timidez, a baixa estima e temor de se expor. Toda segunda observo que aumenta o número dos candidatos! Cada um, no seu tempo, se permite experimentar e se expor; verbalizar aos colegas os motivos pelos quais deseja o posto. Há aqueles sempre prontos; se lançando, muitas vezes sem pensar. Há os  que observam muito antes de se lançar. Há os que têm grande facilidade de expressão. Há os que falam baixinho e os que quase não falam. Mas vão ao encontro do desejo! No início, haviam promessas mirabolantes para chamar atenção dos colegas e ganhar o voto. Coisas que logo viram que não poderiam cumprir... Impressionante como as crianças observam e reproduzem o modo de agir dos adultos (por vezes tivemos uma réplica do horário político, na TV, em época de eleição!) Foram ótimos momentos, quando pudemos conversar, refletir, trocar impressões sobre alguns valores e condutas: autencidade; confiança, honestidade, cidadania, respeito, papel de um lider, responsabilidade, trabalho, bem comum, interesse pessoal, interesse coletivo, ética, educação... Vejo, agora, que se esforçam para  propor aquilo que sabem que poderão fazer, cumprir! Percebo que aprendem com as dificuldades que o antecessor enfrentou. Inicialmente houveram promessas de dar lanche para aqueles que eventualmente estivessem sem... Nossa! Alguns ficaram sem o lanchinho gostoso que haviam trazido de casa... foi uma experiência dura!  Agora, todos prometem que quando alguém estiver sem lanche, vão ajudar a encontrar uma saída para o problema! E passaram a mobilizar todo o grupo para coletar algo aqui e ali e, assim, ajudar o colega sem lanche! Uma surpresa grande foi quando,  há algumas semanas atrás, começaram a surgir os discursos escritos! A maioria fala de improviso, em frente ao grupo; mas alguns, espontâneamente, têm lido suas propostas; justificando que “assim não esquecemos de nada”. E o líder escolhido é fiscalizado! Não deixam passar deslizes; criticam, questionam e até já sugeriram “tirar” um líder que estava “puxando” a bagunça, quando devia “dar exemplo, né professora”?!  Cresce a compreensão de não votar porque é amigo, não votar porque gosta do colega e, que é importante ouvir, observar as propostas dos colegas, tentando perceber quem é que tem o perfil de um bom líder, de fazer boa liderança, no momento! Fico tão orgulhosa! Emocionada, ouvindo cada um e depois observando os olhos brilhando acompanhando a apuração dos votos! Hoje a votação foi acirrada! Tivemos 13 candidatos. Houve empate e na votação derradeira, a diferença foi de 2 votos! Acredito tanto que, no futuro, eles farão diferença e farão diferente... 


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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