Falar ou silenciar?

        Li que um casal convive há mais de vinte anos em silêncio. Após um desentendimento ficaram sem se falar e aí se descobriram felizes. Isto não sai da minha cabeça. Não pelo fato de não se falarem, mas pelo fato de que foi este  “pequeno detalhe” que lhes oportunizou seguir em frente, conviver, ser “feliz”. É o que dizem que eles dizem. Não duvido, porque existem tantas possibilidades de relações... acho que todas que a gente quiser inventar.  Talvez não se falando, se observem e se percebam mais; façam outros tipos de leitura: dos olhos, da expressão do rosto, da postura, do sorriso, das lágrimas, da seriedade, do cansaço, do movimento das mãos, jeito de andar, parar, sentar ... Eu amo as palavras! Ainda estou aprendendo me expressar, soltar o verbo e me encanto com os progressos e descobertas desta fala que se liberta. Mas reconheço suas sutilezas. E aprendi fazer leituras silenciosas, também. Mas interpretei errado, algumas. Assim como me engano quando penso que compreendo a fala do outro; porque na  verdade, muitas vezes falamos por metáforas; falamos o que gostaríamos que fosse; falamos abobrinhas; inverdades; falamos para agradar, seduzir; falamos para nos promover; para ter o que fazer, falando sem pensar; falamos para oprimir, exercendo poder... Mas, por vezes falamos o que sentimos, de verdade! E algumas vezes, falamos com os olhos e com palavras, ao mesmo tempo e coisas diferentes! Nossa! A minha fala ainda se articula e sai melhor através das palavras escritas. E eu, de fato me encanto com esta possibilidade de interagir no silêncio! De me comunicar com o outro através de outros canais, especialmente através dos olhos; através da energia que flui de um pra outro, através da música, através de um toque... embora reconheça que este campo seja delicado. Por outro lado, esquivar do embate das palavras pode ser covardia, imaturidade, defesa... não dá para  saber, julgar, opinar... Bom mesmo é comunicar o que a gente sente e interagir, do jeito que for; sem medo, culpa ou preconceito.

         

Entranhas

Quando tudo se gasta
esgota, desgasta,
passa do ponto
inibe a paciência...
Quando tudo perde o sentido
fica sem graça
árido e áspero
encobre a lua
descolore o arco-íris
censura a palavra e
coroa a mesmice....
Emerge! Das entranhas!
Das memórias mais subterrâneas...
o olhar querido!
E me refaço
reescrevo,
regenero,
ressurjo...
Brilhante!

Fraqueza

    No salão, escutei a depiladora explicar que o pelo encrava porque está fraco, sem força para romper a pele e sair...  Fiquei pensando que de fato, o fraco pena onde quer que esteja. Tende se dobrar, encolher, ”introspectar” quando acuado; ficando prisioneiro dentro de si mesmo, sem força e sem energia para  enfrentar e lutar por si... No caso do pelo, a depiladora completou que para desencravar é preciso ajudar, fazendo uma esfoliação no local. Ou seja, não sairá desta situação sem alguma dor, desconforto. Vejo, então, que aqui também se confirma a máxima de que  são as situações difíceis aquelas que oportunizam crescimento e mudanças. Bela metáfora, belo aprendizado... este, do pelo encravado!!!

Lua linda!

Linda lua
lua  linda
bem vinda!
Cheia de encanto
me deixa feliz, tanto!
Solta, livre, maga
flutuando na noite
grande e silenciosa,
por entre
nuvens  passeadeiras
e estrelas piscantes!
Perfumada,
feminina
derramando-se
sobre nós, cheia de
emoção, doçura!
Enfeitada de brilho,
de mistério,
de meios sorrisos...
timidez e ousadia!
Dançando  sua
dança de encantamento
com todos
e com nenhum;
cativando
e prendendo nosso olhar
ora, desvelando-se,
bela e inteira
ora escondendo-se
atrás de uma nuvem,
de um morro,
um prédio
de um coqueiro;
mexendo com os véus
da nossa imaginação
e com tudo que vibra,
em nós, em sintonia
com amor, beleza,
paixão.
        
         

Encontro

Quando te vejo,
primeiro
tudo se apaga
depois
tudo se ressignifica
enche de valor
e cor.

O corpo


O corpo
é belo,
forte na
extrema fragilidade
é prazeroso
é mistério
é tesouro
é templo
é encontro.

Solidão


Solidão...
Quando não entendia
temia, fugia
sofria.
Quando abri
ficamos parceiras!
E deslizamos.

Um pouco de sossego...

A delicadeza da noite,
da lua
e da brisa
abraça e acolhe
o entardecer
as mazelas
a dor e a dureza
nossas, que,
entregues ou
resistentes,
se deixam ficar
ali, por um pouco,
acarinhadas,
(sem preferências)
neste doce colo
mágico colo...

Sintonia

Conhecer alguém é
um trabalho  pesado
num campo infinito,
muitas vezes infértil;
onde florescem
fantasias, hipóteses
alucinações, equívocos.
Mas sintonizar com alguém...
Ah! Deus, que bom!
Trabalho gostoso!
Leve!  É parceria
num campo fecundo,
do possível, do real;
onde caminhos
mais distantes, tornam-se
os mais fáceis de chegar;
onde a palavra, o abraço
o olhar, o carinho
de quem está mais longe
são os primeiros a chegar!
Sintonia é  bem querer,
onde a saudade cura e lapida
com sutilezas vividas;
é silêncio preenchido,
é sem condição, imposição
e onde pensar, desejar
é já estar, encontrar
sossegar, nutrir! 
Ser feliz!

Você me conhece!

      No trabalho, as surpresas são constantes; um dos motivos do encantamento se renovar e manter ao longo dos anos. As crianças falam cada coisa! Coisas que a gente não esquece, assim como as palavras de amor. Alguns meninos, já grandinhos, entre 9 e 10 anos, brigaram bem feio e eu fui chamada. Já foram meus alunos e nossa relação de afeto é forte. Quando cheguei, um deles começou chorar,  se defender, justificar. Eu fiquei ouvindo, um pouco; também mexida com o fato. É sempre assim! Depois da coisa consumada e diante dos estragos, vamos pensar! E daí dói. Dói na consciência, dói na alma; porque o ato foi impulsivo, foi instintivo; por vezes selvagem, primitivo. E quando a razão e o sentimento entram, dói demais... Eu precisava ser firme,  representando a lei: aquilo não era permitido, não podia acontecer. Não podia ser banalizado. Eles poderiam ter resolvido o impasse de forma diferente; conversando, chamando um adulto para mediar; saindo de cena; enfim... fui questionando, puxando a reflexão e a fala e, eles se sensibilizando e percebendo que o motivo da discórdia era extremamente banal; mas o que faltou, este sim, era fundamental:  respeito. Aquele que mais se justificava e chorava, falou: “ A culpa é toda minha! Os outros não são culpados de nada... mas eu não queria fazer isto, me desculpa! Você me conhece, Maisa!”. Eu fiquei chocada, “pega” por esta fala: “você me conhece”. Muito forte!  E ainda estou refletindo profundamente sobre isto: conhecer alguém. Este lado dele, eu não conhecia! Conhecia outros, da criatividade, da capacidade intelectiva, da doçura, do humor, da curiosidade, da sensibilidade, afeto... Temos tantos lados! E um mundo desconhecido dentro de nós.  A gente não se conhece no todo! Aprendo que vamos nos  conhecendo a cada momento e de acordo com o que ele mobiliza, desperta, provoca... Mas eu acho que sei a que ele se referia: eu conheço uma parte que está em bonita construção, pois acompanho seus avanços gradativos há alguns anos: o caráter. Ele é um bom sujeito! Com certeza será um homem digno, quando adulto, pois aprende a reconhecer o erro. Se choca com a atitude impensada e com o que produziu no outro. Vê o outro e não somente o seu próprio umbigo.  Compreende as consequências. Pede desculpas. É uma criança que cresce por dentro. Junto com os colegas. Participar disto é privilégio. Me faz, também, “crescer” e me conhecer um pouco mais.
                                            

Minhas manhãs

Minhas manhãs!
Eu traço o percurso
determino o tempo
escolho!
Assalto e
enfraqueço
rotinas
muros
grades...
dentro!
Minhas manhãs!
Quietinha
ali... inteira!
E virar mar
areia
horizonte
vento, gaivota,
ponte!
Ponte entre
eu e eu.

Tantos lados...

         O carnaval movimenta os noticiários e o feriado facultativo. Ao mesmo tempo, muita gente trabalhando e vivendo alheia a estes festejos.  A avenida das arapongas, sinuosa e solitária, me chamou para um passeio, ao entardecer. Não parece que a praia movimentada, o trânsito atropelado, os turistas acalorados estão logo ali... Fiquei, como sempre, agradavelmente surpresa com os contrastes ali... a catadora de lixo, remexendo e selecionando o lixo  na lixeira do condomínio de casas elegantes plantadas na natureza privilegiada de verdes! Carros modernos, circulando pelo asfalto contornado pela mata e muitas antenas, presença da tecnologia contrastando com uma casinha simples de madeira, escondida  atrás das árvores. Revelando o ofício do morador, uma placa fixada, displicentemente, no portão de ripas trançadas anunciava: “AMOLA-SE SERROTES”. Olha só! A plantação de palmitos em frente à de eucaliptos, em oposição ou em parceria? Uma, escura, acolhedora, fechada; escondendo cigarras e aves barulhentas retornando ao ninho, depois de um dia deslumbrante de sol e temperatura gostosa. Outra, aberta,  altiva e seletiva, sussurrante! Uma garagem escancarada deixava à mostra um altar; com certeza mais uma pequena igreja  brotando na comunidade (temos uma meia dúzia na redondeza! Dá-lhe reza ou esperteza?) bem ao lado de um botequim de esquina... Lembrei que vi, no jornal, ao meio dia, imagens de “mulherões” com pernas, bundas e peitos modelados à mostra, felizes diante das cameras e dos olhares de admiração e, logo em seguida, a imagem desolada de um homem que perdeu a mulher, jovem, bonita, mãe de um bebezinho,  durante uma “lipo” a que se submetia para ficar mais bonita ainda... Num determinado momento, a música sertaneja, tocada no botequim, onde a cachaça rolava solta, junto com a língua,  misturou-se com a música eletrônica que vinha, a “altos brados” de uma “mansão”, atrás dos altos muros, onde se hospedam executivos de outro estado, que aqui vieram “descansar” e “festar” diferente, no anonimato... Ergui os olhos e me deparei com a beleza de um pinheiro que parecia, assim, naquele ângulo, desenhado no céu (!); muito alto, contornos suaves, silencioso e dativo, próximo a um córrego, que antes era transparente e cantante, mas que agora já está marcado, pesaroso; tão novinho e já, como disse Wander Piroli: “um rio morrendo de sede”. Uma vizinha parou para me alertar sobre os assaltos que estão assíduos na cidade e que, sem demora, podem chegar até nosso “canto”... Entrei em casa um pouco mexida com isto e me deparei com a gatinha Roxo Charruel à beira do lago, contemplando a própria imagem e todas as outras coisas ali refletidas; relaxada, tranqüila, encantada com a descoberta! O que mais a gente pode fazer enquanto vive, além de observar, contemplar e interagir? Se eu “me fecho”, me escondo, me alieno, fujo por medo ou preconceito, posso não te ver passar, chegar, sorrir; me chamar! E isto, perder um abraço, uma troca de saberes, momentos singulares, sim, seria perda irremediável.


Mulher



Mulher!
e gosto de tudo
que povoa
o nosso universo:
formas,
cabelos,
vestidos,
enfeites ,
a gestação,
amamentação,
força,   intuição,
ternura,    energia,
amor, escuta, sedução
inteligência,  ousadia,  fé
perseverança, sabedoria,
nutrição, organização,
superação!
Gosto de me
descobrir mulher
todos os dias e
nas pequenas coisas!
Em detalhes, sutilezas
que surpreendem,
emocionam e amadurecem
especialmente quando
o olhar masculino,
aquele, especial e único,
encontra o meu  e
marca, ao mesmo tempo,
o que nos diferencia e
o que nos aproxima e nos 
mantém em eterna magia,
através dos encontros
e desencontros
nesta longa peregrinação
atravessando tempos, eras,
universos e quimeras...




   

Generosidade















Quando  acordei e
vi o dia lindo que 
me recebia sorrindo
e exalando 
perfumes, 
expectativas, 
possibilidades, 
“atentei” 
com maior clareza, 
que mágoa, 
rancor, 
cara feia, 
preconceito,
mau humor 
é mesmo, 
coisa só de gente.

"Café no bule"

Perder... ninguém quer! E perdemos todos os dias: o tempo que passa, oportunidades, objetos, experiências, contatos, competições,  energia, vitalidade, dinheiro, sentimentos (?), saúde, espaço, espetáculos gratuitos da natureza, confiança, paciência... Um dia, soube de uma pessoa que escondeu um valor considerável de dinheiro num lixeiro, para protegê-lo. A faxineira, que não sabia, mandou para o caminhão do lixo. Um grupo de mulheres simples, do interior do RS, veio, pela primeira vez, à praia. Eufóricas, brincavam na praia, fugindo das ondas, felizes como crianças! De repente, no riso solto, a dentadura de uma delas caiu... desespero, orações (muito católicas), varredura de mãos pelo chão até uma última tentativa de solicitar ajuda ao salva-vidas; tudo em vão! Há muito tempo atrás, perdi um  bebê em gestação. A morte, aparentemente, é invasiva como um ladrão esperto e ágil, que rouba o que  temos de mais precioso... Um dia encontrei a expressão “amor-te”, num texto psicanalítico e isto produziu um efeito gradativo de mudança e aceitação em relação a ela.  Um conhecido, recentemente, tentou suicídio porque a mulher separou-se dele e se apaixonou por outro; está por um fio, 1 % de chance de sobreviver... É fragilidade ou infantilidade colocar a nossa felicidade nas mãos de algo ou alguém?  Equívocos, quando se tornam conscientes, configuram-se em perdas terríveis. O que dói mais: perder ou renunciar? Abandonar ou ser abandonado? O que é mais terrível: ser egoísta ou submeter-se? Tantos meandros, sutilezas, senões, variáveis, jeitos de olhar, de sentir, de pensar... onde não se encaixam os julgamentos. É consenso entre filosofias espiritualistas, mestres de todos os tempos e etc, que o sofrimento (e toda sua família, inclusive a perda) é fonte de crescimento, purificação, evolução. Porém, para fazer este mergulho no vazio da falta, da rejeição, da invasão e desrespeito do outro; acho que é mais ou menos como diz o meu pai e os mais velhos, lá na minha terra :”tem que ter café no bule”! E, encontrar o "café" é que "são elas"...  

Junto

Junto!



É assim.
Um espaço
infinito, belíssimo
que se abre
com bordas amorosas
e protetoras
que acolhem quem chega,
acompanham quem vai.
Junto é tempo presente
sempre!
Uma carícia constante
e sutil que
desenterra tesouros
desvenda mistérios
inspira, renova, anima
a alma!
Junto! Olhos, mãos,
vontade,
sentimentos tornados
pontes,
arco-íris,
ligando mundos
aproximando distâncias
produzindo
incessantemente
emoções e bem,
quietude e calor
alegria!
Forte. Mágico!
Junto.

Frio que aquece

Brisa gelada
conhecida
esta que entra
pela janela
acordando os sentidos
antecipando as
sensações das
manhãs de inverno...
ensolaradas, luminosas!
Cobertas quentinhas
pedaços de lenha
cantando seu ofício e
o calor do fogão
irradiando proximidade...
chaleira chiando ritmada
chamando para aquecer
o corpo que tirita e
resiste, preguiçoso,
aos movimentos...
Vontade de ficar assim
entre as pálpebras
semicerradas
na dúvida entre o que é
real e o que são recordações
da memória sensorial...
Saudade de um frio
que povoou a infância
e grande parte da vida
de sons e imagens,
sentimentos e percepções
como nenhuma outra estação.
Com o frio, sempre chega a
saudade... de algo distante
de algo que é presente
e importante...
O frio, assim, produz calor
e o calor, doce e sedutor,
atualiza, agiganta o meu amor


Minha foto
2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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