Você me conhece!

      No trabalho, as surpresas são constantes; um dos motivos do encantamento se renovar e manter ao longo dos anos. As crianças falam cada coisa! Coisas que a gente não esquece, assim como as palavras de amor. Alguns meninos, já grandinhos, entre 9 e 10 anos, brigaram bem feio e eu fui chamada. Já foram meus alunos e nossa relação de afeto é forte. Quando cheguei, um deles começou chorar,  se defender, justificar. Eu fiquei ouvindo, um pouco; também mexida com o fato. É sempre assim! Depois da coisa consumada e diante dos estragos, vamos pensar! E daí dói. Dói na consciência, dói na alma; porque o ato foi impulsivo, foi instintivo; por vezes selvagem, primitivo. E quando a razão e o sentimento entram, dói demais... Eu precisava ser firme,  representando a lei: aquilo não era permitido, não podia acontecer. Não podia ser banalizado. Eles poderiam ter resolvido o impasse de forma diferente; conversando, chamando um adulto para mediar; saindo de cena; enfim... fui questionando, puxando a reflexão e a fala e, eles se sensibilizando e percebendo que o motivo da discórdia era extremamente banal; mas o que faltou, este sim, era fundamental:  respeito. Aquele que mais se justificava e chorava, falou: “ A culpa é toda minha! Os outros não são culpados de nada... mas eu não queria fazer isto, me desculpa! Você me conhece, Maisa!”. Eu fiquei chocada, “pega” por esta fala: “você me conhece”. Muito forte!  E ainda estou refletindo profundamente sobre isto: conhecer alguém. Este lado dele, eu não conhecia! Conhecia outros, da criatividade, da capacidade intelectiva, da doçura, do humor, da curiosidade, da sensibilidade, afeto... Temos tantos lados! E um mundo desconhecido dentro de nós.  A gente não se conhece no todo! Aprendo que vamos nos  conhecendo a cada momento e de acordo com o que ele mobiliza, desperta, provoca... Mas eu acho que sei a que ele se referia: eu conheço uma parte que está em bonita construção, pois acompanho seus avanços gradativos há alguns anos: o caráter. Ele é um bom sujeito! Com certeza será um homem digno, quando adulto, pois aprende a reconhecer o erro. Se choca com a atitude impensada e com o que produziu no outro. Vê o outro e não somente o seu próprio umbigo.  Compreende as consequências. Pede desculpas. É uma criança que cresce por dentro. Junto com os colegas. Participar disto é privilégio. Me faz, também, “crescer” e me conhecer um pouco mais.
                                            

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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