Guria

Chuvinha...
Ah! Presente especial,
cantando minhas notas,
assim,
na virada do dia;
quando o tempo
espia, esparramando-se
na madrugada
e diz que
hoje fico mais velha...
- Mas, me sinto guria!


Sobressaltos





É fato
que ondas e ventos
são diferentes
aqui e ali,
como palavras
e toques;
suavidades
e asperezas;
desejo
e sossego;
alaridos e
silêncio.
Todos têm seu momento,
demanda,
alternância.
Mas nem todos,
linearidade
e “ahimsa”...
Aos sobressaltos
meu coração
sobrevive,
suaviza
    e armazena.


Querer maior


Há um querer maior,
um algo a mais
que abraça,
inspira, afaga,
espera,
confia,
aposta e
sustenta
o bonito,
o ideal...
quando tudo desacredita...
Sim, há um querer maior
que conforta
e acomoda
isto que é possível
experimentar, alcançar
de acordo
com o desejo,
o esforço,
a alegria
e o prazer,
num momento,
ou numa vida!


Ternura

- Vovó, seus óculos estão molhados! –  atenta, falou a pequena, na porta da sua sala de aula, observando os óculos da avó - recém chegada - que estavam pendurados no seu pescoço.
Claro. Retornando da casa da amiga, a vó enfrentara uma forte garoa. Descuidada, não percebera o fato, saudosa que estava para dar um abraço na pequena, que não via desde o dia anterior!
- Deixa eu limpar! – e, ato contínuo, a pequena aproximou-se o mais que pode da avó, puxou a camiseta do uniforme e com a pontinha, começou a secar os óculos da mesma, com determinação e suavidade. E com certa dificuldade, porque a vó estava em pé e ainda num degrau abaixo...
Tudo muito rápido!  Mais rápido do que os reflexos da avó... mas não mais rápido do que a sua emoção... ela abaixou-se e abraçou, com um abraço gigante, de amor absoluto, aquele serzinho, tão pequeno, mas tão  cheio de delicadezas, sensibilidade e de um olhar profundo, que olha e vê; como toda criança!


O possivel

A impossibilidade
fortalece.
O possível
acarinha
e alimenta.

Saudade



Chove...
é chuva,
choro,
encanto,
transbordamento.
Canção antiga,
saudade
repetida;
saudade de amor...
deste perfeito
amor imperfeito.



.

Sossego

Maior do que
o fantasma
do medo;
maior do que
esperada e
intensa alegria;
é a profundeza
do sossego.
Onde tudo
é como é,
está como está;
sou como sou
no meu lugar,
no meu fazer
e o outro não
está para me satisfazer.

Câmara Mirim

      

             - “Crianças! Imagino que muitos de vocês, talvez,  estejam aqui, agora, pensando: “este lugar é ruim, cheio de políticos ladrões, corruptos”... “política é uma coisa suja”...  Mas escutem! Eu digo para vocês que a política é uma coisa boa! Necessária! Muito importante! Ruim, ladrão, corrupto, sujo... é o mau político! Não, a política! Nós abominamos e queremos acabar com o mau político e não com a política”.
        Esta foi a fala inicial de um vereador que nos recebeu em seu gabinete, numa visita que fizemos, com os alunos, à Câmara de Vereadores de nossa cidade, na semana que passou. Eu gostei desta fala. Não vou questionar interesses que possam estar embutidos nela, neste momento. Quero acreditar que podemos amadurecer e mudar. Educo crianças. Tenho esperança! Educo para PENSAR, observar, refletir, conversar, ouvir. E penso; observo, reflito. Converso e escuto...
        Por estes tempos, também eu me decepcionei com os políticos. No entanto, como disse, acredito que possamos educar para uma cidadania participativa; mais consciente e justa. Por isto gostei desta fala específica do vereador. Acredito, sim e de verdade, que as crianças de hoje possam fazer diferente amanhã! Não somente em relação aos políticos hipócritas; mas também em relação à ignorância, a todos os ranços, preconceitos, falsos moralismos, infantilidades e péssimos exemplos que damos, frequentemente, às crianças e jovens. Todos os dias, uma enxurrada de demonstrações, informações, notícias, compartilhamentos mostram o quanto nossa sociedade, nossa civilização está dolorosamente doente, carente. Como Malala, a garota paquistanesa; como tantos homens e mulheres que deram sangue, suor, tempo, inteligência e vida em prol disto; como colegas e outros desconhecidos; acredito que só conseguiremos mudar esta realidade com o CONHECIMENTO, com a EDUCAÇÃO ou REEDUCAÇÃO. De todos! Não só da e na escola! Teremos que batalhar por uma mudança de “dentro para fora”. E antes ou paralelo ao vício de apontar o erro do outro, teremos que ter ou cultivar a  coragem de olhar para nós mesmos... Mas volto à visita...
        Fomos à Câmara para assistir a seção da CÂMARA MIRIM. Eu me encanto com esta ideia, há tempos; mas somente agora conseguimos concretizá-la. Muito interessante! Aparentemente um trabalho bem cuidado e organizado; realizado com adolescentes eleitos, em suas escolas, para compor o Legislativo Mirim. Como estamos com este costume de duvidar de quase tudo; ao final, não resisti e perguntei aos vereadores mirins se as proposições deles eram levadas a sério pelo Executivo...
        Ah! Os olhos brilharam! O presidente da atual Câmara Mirim, uma garota... então melhor dizendo, a presidente; falou que sim! Que muitos projetos encaminhados por eles tiveram acolhimento e foram executados! E que eles tinham gostado tanto desta experiência, que estavam tristes em ter que sair: o mandato é de um ano e o deles está encerrando. Logo haverá nova eleição.
O meu olho também brilhou! Observei que nossos alunos estavam gostando de ouvir e de conversar com a turma dos vereadores mirins; que depois da seção deu uma grande atenção a eles. 
Gostei ainda mais deste projeto! Especialmente por constatar que aqueles adolescentes (de 12 a 15 anos) levam a sério a experiência; comparecendo às seções e fazendo indicações pertinentes ao prefeito. Mesmo algumas ingênuas ou de difícil realização (porque elaboradas de acordo com a ótica, compreensão e ímpeto da idade); todas elas revelaram um olhar atento às necessidades da comunidade e das escolas. E como já externei; apreciei imensamente o fato de que a Administração do município acolhe, contempla o grupo; dando a ele não somente espaço; mas voz e vez.
Um aluno nosso sugeriu, quando estávamos visitando um dos gabinetes dos vereadores adultos, que, assim como havia a Câmara Mirim, poderia haver, também, um prefeito e um vice-prefeito mirim. A sua sugestão foi acolhida, com entusiasmo, no momento. Mas eu não alimentei a ideia de que, de fato, isto seria levado a sério (novamente, a desconfiança; este vírus que instalou-se em nós, infelizmente)... mas fui surpreendida! Agradavelmente! Adoro ser surpreendida! Tão logo cheguei em casa, recebi cópia do ofício, elaborado no gabinete daquele vereador, que seria encaminhado ao prefeito. Nele constava a visita da nossa escola, o nome do nosso aluno e sua proposição!
Mais importante do que acontece e do que observamos lá, é a repercussão que a experiência teve e terá na vida de cada um dos nossos alunos! Nosso desejo é o de que seja positiva, construtiva e inspiradora.
Como alguns dizem por aqui, diante de um acontecimento: será que nós, professores que acompanhamos os alunos nesta visita, dormimos animados, naquela noite?!!! Eu, toda vez que lembro, sinto abrir um riso de orelha a orelha e que, sutilmente, minha esperança aquece...


Encontro


Despida
dos invólucros,
títulos,
certezas,
ilusões,
o que resta?
A ternura.
Por ser
quem sou.
Pelo outro ser
quem é.
O encontro.

Privilégio




Silêncio
é privilégio!
Contemplar,
na quietude,
a quietude.
Encontrar
com as palavras
antes de traduzí-las...
E também
com as singularidades;
distinguindo-as
entre mesmices.


Desejos


Que sob os verdes
só houvesse
a calmaria.
Sob casas e prédios,
apenas ninhos.
As noites?
Inspiração
e enlaçamentos.
O dia?
Ah! Justo!
Um fazedor de
inusitados,
professor de
sabedoria.


O Bloco da Bernunça











Adoro ser surpreendida! Encontrar com o inesperado adorável! Ver surgir o maravilhoso de onde não espero; especialmente quando estou sem expectativa alguma! 
Assim foi neste domingo de carnaval, em Floripa. Minha netinha fez amizade com umas meninas, no condomínio; isto nos aproximou da avó delas. Ela, gentilmente, partilhou e fez o convite: “vocês deviam levar a pequena ver o Bloco da Bernunça”, ali em Coqueiros. É muito bonito e tranquilo para as crianças. Vamos levar as nossas”... E nós fomos.  Improvisamos uma fantasia para nossa pequena e fomos, a família toda! Ela adorou o lugar, os brinquedos e a neve artificial! Bah!!!! Delícia!!!!! Assim como as outras crianças, curtiu muito explorar; se lambuzar com aquela meleca geladinha!!!!!
Local maravilhoso! Bem ali, indiferente ao movimento da avenida paralela; emoldurado pela singeleza dos verdes, do azul do céu,  do mar, das pedras e dos barcos ancorados... Observei as pessoas  chegando... adultos sem pressa;  trazendo pela mão, no colo e nos  carrinhos, suas crianças coloridas de alegria, de fantasias e de curiosidade! Devagarinho todo mundo foi “se ajeitando” e quando vi, a roda estava formada! Amo uma roda! Adultos, crianças, alguns adolescentes e idosos; singularíssimos, partilhando espaço, acomodados na grama, atentos ao narrador da história do BOI. Uma história cheia de magia, que repetida e sempre nova, vem encantando olhos e corações.
Excetuando o casal narrador, estilosos “manezinhos”, os demais atores eram crianças. Crianças do bairro. Aliás, o Bloco é do bairro. Há um desejo, um empenho, presente e visível, na comunidade, em preservar a memória, as raízes, a cultura popular. A identidade.
Foi um espetáculo belíssimo! Público e personagens interagindo alegremente; as emoções alternando sem constrangimento! Palmas, risos, fotos... os adultos relaxados, reencontrando a graça, na graça! Impressionou-me a quantidade de idosos presentes e participantes, felizes! E as crianças! Umas empoleiradas nas garupas e colos seguros de familiares; outras dançando com o boi; jogando capoeira com os macacos, dando as mãos aos demais personagens ou sendo “engolidas de mentirinha” pela Bernunça!!!! Todas presas na teia da magia instaurada, um misto de curiosidade, medo, desafio, fantasia e realidade.

Espetáculo findo, todo mundo indo embora tranquilamente, sem atropelos; pegando uma última pipoca; uma última escorregada no escorregador; último pulo na cama elástica; um último sorriso ao outro, um conhecido ou desconhecido próximo. Festa com tempo limitado. O suficiente para ninguém cansar, extrapolar. Suficiente para convocar a genuína alegria, aproximar afetos, aprofundar laços, alimentar a vida com alimento orgânico. 











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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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