RODA

Toda vez que vejo uma roda, lembro do quanto gosto de estar, entrar numa roda; do quanto amo a RODA! Organizar uma RODA! Roda para conversar, roda para escutar, roda para rezar, roda para brincar, jogar;  roda para dançar, roda para estudar, velar, celebrar... roda para esperar... Um dia destes, escrevendo a palavra, percebi, surpresa, que RODA, ao contrário, é A DOR. Tive que rir de mim mesma com esta descoberta tão evidente e tardia!!! Bah! Mas achei o máximo! Considerando minhas percepções, realmente faz sentido: para mim, estar fora de uma roda é uma dor!
 Na roda, estamos ao lado. De outro modo estamos atrás ou na frente. Círculos são aconchegantes, deslizam. As retas, espetam.
Minha primeira lembrança de roda é antiga! Está lá na infância, ao redor do fogão à lenha, no inverno, esquentando as mãos, ouvindo o “chio” da chaleira e esperando com ansiedade e alegria, as fatias de polenta e queijo; batata doce ou pinhão serem sapecados na chapa... Cresci participando e observando as rodas de chimarrão da mãe e das tias, na casa da nona, partilhando a vida simples e ouvindo os “causos” contados pelo nono... E a vida seguiu assim, de roda em roda, atualizando ou festejando o cotidiano com amigos e familiares nas rodas de conversa, geral ou inevitavelmente regadas a chimarrão.
Neste percurso, fui descobrindo, encontrando e me identificando com outras rodas: as ancestrais (sempre me encantou imaginar os povos primitivos ao redor das fogueiras); as indígenas, as de dança, as de trabalho, as de cura, as de estudo, as de brincadeiras, as de contação de histórias e as literárias! Professora, nunca gostei das carteiras em filas, em sala de aula. Sempre que possível, organizei a roda. Se não era possível, por causa do espaço, ao menos uma “meia lua”. Em fila, sentia-me distante dos alunos, desconfortável.
 Do meu ponto de vista, numa roda, todos podem ser vistos, ter vez, voz ... As escutas e leituras que acontecem ali, não são só de palavras, acontecimentos, mas de semblantes... muitas vezes isto é o que de fato importa: o semblante  que fala da realidade que está dentro e que está fora. Numa roda, nos damos a conhecer. Fica mais fácil olhar no olho, segurar a mão, dar um abraço! Amparar, perdoar, se desculpar, se expor. Na roda, ninguém é chefe, mesmo que haja um; na verdade, um mediador, um mais velho ou mais experiente que os outros, só. A roda suscita ideias e estimula fraternidade, bons sentimentos, desejo de acrescentar, pensar coletivo. Favorece a renúncia quando a ideia do outro é melhor.

Tem gente que não gosta de roda. Tem. Tem gente que tem medo desta proximidade, desta igualdade, deste toque inevitável que ela favorece. Eu amo! E, graças! Não estou só, neste apaixonamento!  Acredito, como tantos: encontramos saídas para os nossos problemas pessoais e coletivos quando sentamos nossas semelhanças e diferenças, numa RODA! Ali, elas têm oportunidade de trocar, aprender e conviver. 

Força

Meu filho, numa trilha em Gatineau, Quebec, encontrou algo, tirou uma foto e enviou-me com um recadinho:
- “Mãe, lembrei de ti; achei que ias gostar de fazer uma escrita sobre essa árvore fininha segurando a grande, que já está pelas últimas”...
E para um dos irmão, justificou:
... “ ela ia parar e tirar uma foto disso, que eu sei”...
Oh! Que bonitinho!!!! E certamente, eu ia! Se eu estivesse com ele, neste lugar, ia parar, tirar a foto e escrever algo sobre isto, depois, sim! Meus “filhotes” sabem muito de mim! Isto me emociona e fortalece. Estas leituras de mundo são as minhas leituras preferidas! As que mais me encantam! Paulo Freire, disse que “A leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Isto, de fato, é bonito mas é mais! É profundo! Revolucionador! Quando a gente se dedica, se permite; faz leituras maravilhosas da natureza, das melodias, dos acontecimentos. Das pessoas. Das dores e das alegrias. Eu gosto muito! Humaniza e aproxima.
Observando a foto, tirada com carinho por alguém que se colocou no meu lugar e olhou para ela com os meus olhos; eu me questiono sobre o que é FORÇA e onde está a FORÇA? Quem é forte, quem é o fraco, ali?
Quantos fortões, machões, tiranos, perversos, aproveitadores, grosseiros, violentos o são respaldados pela bebida, por uma arma, uma doença; pelo gênero, por uma outra pessoa, por um grupo, pelo dinheiro, pelo conhecimento, pelo preconceito, pela fé, pelo poder... e quando isto, estas muletas lhes são tiradas, revelam-se incapazes, fracos, sem palavra para conversar; sem reserva interna para suportar, seguir e cuidar da vida, sozinho. Quantos! Quantos! A natureza, a história e o cotidiano têm incontáveis exemplos...
Numa floresta, uma árvore aparentemente “frágil”, sustenta outra, aparentemente “forte”! Nossa! Quanta coisa para “ler”, aí... Coisas assustadoras, injustas, preocupantes... mas também coisas pungentes sobre coragem, troca, ajuda, comunidade, importar-se, entrega, humildade e, sim... superação e FORÇA!


  


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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