Ir e vir

         


         Concluí, há pouco, a leitura de “O casaco de Marx”, de Peter Stallybrass (nascido em 1949), com a tradução de Tomaz Tadeu. Era o título da nossa leitura do mês, na RODA LITERÁRIA.     
        O livro tem três capítulos. O primeiro e o segundo falam da “Vida social das coisas: roupa, memória, dor” e sobre “O casaco de Marx”. Neles, o autor nos faz pensar sobre nossa relação com as roupas e com as coisas em geral. Através das idas e vindas do casaco de Marx, oportuniza uma reflexão sobre as complexas relações entre as coisas como objetos de uso, como objetos aos quais imprimimos nossas marcas, como objetos que carregam nossa memória e como mercadorias. Peter Stallybrass, que sempre teve um interesse em escrever sobre roupas, faz um passeio pela história, relacionando neste sentido, outras épocas e escritores  com o que acontecia na época de Marx; quando havia uma relação estreita entre as roupas e as Casas de Penhores:  As roupas, na verdade, e não os utensílios de cozinha eram as coisas mais frequentemente penhoradas” (pg 61). E que o padrão costumeiro no comércio de penhores, na época  era este: “os salários recebidos na sexta ou no sábado eram usados para resgatar as melhores roupas da casa de penhores. As roupas eram vestidas no domingo e então penhoradas, outra vez, na segunda-feira... e o ciclo era rápido: a maioria dos itens era penhorada e depois resgatada, semanal ou mensalmente. A própria taxa de penhora e resgate era um indicador de riqueza e pobreza” (pg 62)
        O terceiro capítulo, “O mistério do caminhar”, cativou-me particularmente, porque a mim encanta o olhar e a reflexão sobre aquilo que geralmente passa desapercebido; por vezes, invisível  aos olhos que não se detém. Aprecio as minúcias, pequenas coisas, detalhes, sutilezas. Nele, o autor, com maestria e poesia, traz observações, detalhes, lembranças, trechos literários de outros autores que nos “obriga a ver a singularidade do caminhar” (pg 81). Reflete que “...quando se caminha com relativa comodidade é fácil achar isto natural. Esquecemos que se trata de um feito extraordinário, um feito que podemos perder a qualquer momento – por causa de algum ferimento, de uma artrite, de um acidente vascular.” (pg 82). Muito bom! Vale conferir! O livro todo um “texto poético e comovente”!

        Exatamente a dor e não a estética, tem feito com que eu sinta, perceba e me ocupe mais com meus pés e com o meu caminhar. Tenho valorado muito as caminhadas, as distâncias e principalmente as trilhas (adoro!) que percorri e não sei se voltarei a percorrer. Eu subia as escadas, que me conduzem pela minha casa, correndo, pulando e, agora, preciso subir devagar e até, em alguns momentos mais agudos de dor, do apoio de um corrimão; contrariando meu impulso, meu hábito e minha cabeça recheada de memórias saltitantes, de leveza e agilidade. Agora, acarinho meus pés, minhas pernas com doçura, gratidão e maior consciência! Com um respeito ainda maior aos que têm esta limitação mas que não se deixam limitar por isto. Desejo continuar a desfrutar deste direito e desta liberdade de “ir e vir”, que tanto era venerado pelo meu pai, o Ximitão e que ficou como seu maior legado.  Ir e vir no movimento, no sentimento, no pensamento, no aprendizado e nas atitudes; reconhecendo, nisto: valor e conquista, não só minha, mas dos que me antecederam. E é o que pretendo, também, deixar como herança para os meus.

Capivara

       

     Assistia um filme... Era madrugada, umas 03h00, mais ou menos... de repente, um barulhão lá fora! Num primeiro momento, não dei muita importância, porque de quando em quando, acontece que as folhas das palmeiras caem e fazem barulho... Algo, porém, não estava de acordo; o barulho, desta vez, não era nada semelhante ao costumeiro. Fui espiar e vislumbrei, dentro da piscina, lá embaixo, algo enorme, movendo-se de lá para cá!
        Então fiquei assustada! Nisto, meu marido, que acordara com o barulhão, também observava o movimento na piscina:  
        - É um cachorro! – afirmou.
     Tranquilo, ele desceu. Eu fiquei observando e pensando em como iríamos tirar aquele cachorro enorme de dentro da piscina... Já pegamos gatos, gambás... animaizinhos pequenos que, acidentalmente caem na água; mas um cachorrão daquele tamanho, não!
        - Talvez tenhamos que chamar os bombeiros ou o pessoal do IBAMA! – falei, sem pensar.
        As árvores e as sombras da noite impediam uma boa visibilidade e não consegui acompanhar todos os movimentos lá embaixo... Não avistei mais o animal dentro da piscina e nem o meu marido! Eu estava curiosíssima! Aparentemente estava tudo calmo, mas não me atrevia a descer...
        Mais alguns minutos e meu marido retornou, rindo!
        - Não era um cachorro! Era uma capivara! – disse.
       Quando ele chegara lá embaixo, o animal já tinha conseguido sair da piscina e ficara por ali, parado, encarando o Toninho com tranquilidade, sem um pingo de assustamento ou constrangimento! Depois, calmamente, a sra ou o sr capivara desceu as escadas e jogou-se no laguinho; ficando somente com a cabeça de fora, curtindo e ainda encarando firmemente o dona da casa... Logo em seguida, sem despedidas, sumiu nas águas.
        O Toninho, meu marido, não sabendo o que fazer, abriu o portão da frente de casa...
        - Deixei o portão aberto para o caso da capivara sair do lago e querer voltar para a casa dela... – justificou e voltou a dormir.
        Eu perdi o final do filme que assistia e não dormi assim tão fácil, pensando na visitante e em como seriam as coisas se ela não quisesse ir embora...
      Na manhã seguinte, nem sinal da capivara! Concluímos, seguindo as marcas de suas patas, que ela tinha ido embora, sim; mas que não saíra pelo portão, não!  Voltara por onde entrara, por um vão na cerca que separa nossa casa da mata, ao redor. Toninho, então, consertou a cerca.
        Há algum tempo estamos observando o aparecimento de aves e outros animais estranhos ao nosso contexto. Acreditamos que estão vindo em busca de alimento e de um lugar seguro para ficar... isto sinaliza o quanto não estão bem, as coisas, no nosso meio ambiente. É triste.

        Isto aconteceu há poucos dias e eu continuo pensando no que aconteceria se ela não tivesse ido embora ou se voltasse, sozinha ou trazendo amigos e filhotes... como seria nossa convivência por aqui: família, gatos, lagartos, gambás, peixes e a capivara...

Amor


Nunca  amei tanto
ao mesmo tempo
em que me distancio,
para sempre,
do amor...
daquele cor-de-rosa!
Ele desvestiu-se,
trocou de roupa,
lugar e forma.
Deixou de ser urgência,
tornou-se ar.
Vital,
mas tranquilo
e o tempo todo comigo!


Mãesagem, o blog, aniversariou!


11 anos de blog!
Um tempo rico, de muitas transformações.
Um tempo com muitos tempos...
Houve o tempo em que as palavras,
que eu amo tanto,
jorravam diariamente, feito enxurrada,
águas represadas, que finalmente
encontravam a liberdade!
Com o passar do tempo
e do exercício, foram aquietando
mais seletivas e reflexivas...
Houve um tempo em que elas
viviam escondidas, inseguras.
Depois, amadureceram;
sentiram desejo de mostrar-se;
curiosidade em encontrar o outro,
dar-se a conhecer...
e expuseram-se!
Com desejo, mas com cautela;
Mantendo meu coração em suspenso!
Hoje, nossa intimidade é maior,
aprofundou. Dialogamos muito:
eu e as palavras!
Elas e eu sabemos do seu valor.
Eu e elas sabemos do bem
que me fazem;  de sua
essencialidade no meu cotidiano!
Cuidamos e alimentamos
nossa parceria
sem arroubos,
com afeto, olhar, escuta.
Cúmplices!
Assim, seguimos,
envolvidas por amor:
eu e as palavras!
No tempo do sentimento e da
maturação dos significantes...
E agora, meu coração acolhe e
palpita tranquilo, suave.




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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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