Realidades



Abri a janela...
Um cheirinho de primavera
veio de longe;
adentrou com
a brisa curiosa e
com a maciez de um calorzinho...
Envolveu-me!
Mexeu comigo,
solicitando atenção.
Então olhei!
Os verdes todos
numa  conversa movimentada;
duas, três borboletas  dançando
entre eles...
Alegria frouxa!
Minhas violetas
florescidas! Risonhas,
banhando-se  de sol
atrás das vidraças!
Uma  bougainville  espaçosa
abraçando,“sem cerimônia”,
um telhado,
quase que por inteiro,
com bougainvillezinhas vermelhas,
precoces, espiando
a tarde de azul belíssimo...
Uma bananeira inclinada
suspendendo, bravamente,
uma “penca radical”
sem medinho nenhum
de “embananar-se” lá no chão...
Fui fisgada por aquela
realidade pacífica
e generosa de um momento,
de uma tarde
coexistindo
com outras realidades
de dor, rupturas,
desastres,  misérias...
Tomou minha emoção!
E eu a quis por inteiro
e prolongada!
Que fosse suficiente!
Bastasse
para serenar
inquietudes
e complexidades
cotidianas...
E naquele momento,
foi.


Justeza



Acinzentaram o céu!
E também
o brilho das plantas,
a cor das flores
e a esperança
nos corações.
Porém, o
SOL é justeza
e  amor!
No final do dia,
paciente,
venceu resistências,
abriu espaço
por entre as nuvens
e dourou tudo!
E todos!
Sem distinção.
Generoso! Amoroso!
Ah! O amor...
parceiro de tanta
coisa linda, sutil,
importante, essencial...
Mas, é impossível
amar sem respeitar!
O contrário, sim.
Dar conta de respeitar
abre o peito! Liberta!
... para amar!

Boné


            


O pai gostava de usar boné! Era extremamente cuidadoso com a pele, muito clara. Seguia, à risca, as orientações da dermatologista, usando, religiosamente, protetor solar e o boné para proteger a “careca”. Era um ritual bonito de ver, este, sempre antes de qualquer saidinha de casa. E usava, sem trégua, o mesmo boné por longo tempo... Eles iam descolorindo, “afinando” de tanto uso e de tanto a mãe lavar. Não se preocupava com a aparência; só com a utilidade. Por isto, de quando em quando, um familiar o presenteava com um... geralmente de cor ou detalhe vermelho, porque era apaixonado pelo Inter! Mas afirmava que não era fanático!
Quando fazia as pequenas viagens, vindo do RS até SC, para me visitar, trazia dois ou três bonés. Dizia, no tom de gozação que lhe era peculiar: - “Olha aqui, minha filha, trouxe três bonés pra fazer bonito e ninguém pensar que só tenho um”! Mas se a mãe ou um de nós não lembrasse, usava sempre mesmo! E todos nós, aqui ou lá, sempre fazíamos muita graça com este assunto! Alémde exibir os bonés, gostava de demonstrar que ainda tinha boa memória, nomeando quem o havia presenteado com qual boné.
Alguns meses antes de falecer, o pai ganhou o último boné. O genro trouxe um, todo vermelho, do Canadá; deixando-o muito contente! O boné era precioso não só porque era novo, vermelho e vinha do “estrangeiro”; mas principalmente porque naquele país distante, morava um neto e o boné trazia e recordava muito, muito afeto e belas lembranças... de uma vida toda... de muito carinho, partilhas e alegria!
Depois que o pai “se foi”, a mãe desfez-se de quase todas as suas coisas. Guardou umas poucas e entre elas, o boné vermelho, vindo do Canadá. Ela o pendurou num lugar, na cozinha, justificando: - “deixo o boné ali, para me fazer companhia”! Impossível a gente andar por ali, sem ver o boné, sem fazer um comentário e sem dar boas risadas, porque lembrar do pai é, via de regra, chamar alegria; porque ele era um “baita gozador”.
Foi ali, na cozinha, que surgiu a ideia de levar o boné do pai para viajar conosco, a Goiânia. Eu e um dos meus irmãos levamos, em Julho, a mãe para visitar o Santuário do Divino Pai Eterno, em Trindade. A mãe nunca tinha viajado de avião e ia realizar dois sonhos: visitar o Santuário e “andar de avião”. O pai, quando vivo, dizia ter medo de avião. Mas gostava de viajar! Era um apreciador das “mãesagens”; não perdia um “lance”, um detalhe! O passeio ao Santuário foi bonito, leve, alegre, intenso...
Bom demais andar e olhar, de vez em quando, pra vida, com os olhos curiosos do pai e com um boné na cabeça, para proteger a “careca”, as ideias e os sonhos !
Hoje, o Ximitão faria 87. Saudade!

Fartura

Na tarde que surgia
despretensiosa
e sonolenta;
o sol, um atrevido,
invadiu os verdes,
adentrou minha janela
e iluminou minha mesa
servindo meu prato
de calor, brilho
e um tantinho de amor!
Gulosa, ah! fartei-me!

De pai pra filho


Acarinho meus irmãos!
Estes queridos que levam
no nome, genética,
semblante e singularidades,
um pouquinho do nosso pai!
Homens sérios
diante das coisas da vida;
de abraço amoroso,
olhar terno, sorriso largo,
alma sensível!
Em versões diferenciadas,
pais queridos
de outros queridos;
tentando viver e 
fazer seu melhor;
aprimorar limitações e
perpetuar qualidades
e talentos herdados
do nosso querido Ximitão,
que, por hora, passeia

em outras dimensões!

Rainha

Quanta delicadeza,
assim, de manhãzinha,
encontrar,
coroada de orvalho,
a graciosa folhinha!
Entre grandezas,
Ilustres nomes,
cores, aparências,
vaidades sutis;
quem foi coroada rainha,
no amanhecer do dia,
pelo rei, sol gentil,
foi a simplicidade,
a beleza despretenciosa
da folhinha!

E eu vi!!!!!

Uma história de amor

       
       
        A leitura é um fazer, prazer extraordinário! Ler é dar encanto ao cotidiano! E trabalhar a  leitura com os alunos é sempre um reencantamento! Interessante é observar como os livros, suas histórias e a lidança com eles, marcam momentos, aprendizados, épocas, pessoas...
Meu primeiro contato com leitura, com os livros de literatura, foi quando entrei na escola, aos 7 anos. Não tenho lembrança de adultos comprando, lendo ou crianças interagindo com livros, até então. Minha professora de 1º ano, era sensível, maravilhosa: foi ela quem me apresentou os livros e a escrita! E o primeiro livro que tive nas mãos, foi um livro de Contos de Fadas. Ali me apaixonei pelos príncipes, princesas, fadas; pelas histórias e pelas letras. O mundo, gradativamente abriu-se para mim e então eu passei a “ver” atos de leitura ao meu redor:  meu pai lendo jornal; minha avó paterna lendo revistinhas  alemãs. Bem mais tarde soube que eram romances e isto, de uma certa forma, me  aproximou mais dela, porque a vó, sempre às voltas com a costura e o jardim;  gostar de romances e ainda saber ler alemão, era algo muito grande e especial, dentro do meu imaginário, da minha realidade, percepção e compreensão de mundo e de leitura!
         Eu tinha um tio que morava em Porto Alegre, o tio Atílio. Nos visitava de quando em quando e  numa destas visitas, presenteou-me com uma coleção de livros e só então eu soube que ele trabalhava para Livraria e Editora Globo, viajando e vendendo livros. Eram obras de Karl May, um escritor alemão, que eu soube, muito tempo depois, ser um dos escritores alemães mais vendidos da história. A coleção era composta de doze volumes; romances de aventuras vividas no Velho Oeste americano, no Oriente e na África. Foram os primeiros livros que eu ganhei na vida! Fiquei profundamente grata ao tio e guardei-os com o maior carinho e ciúmes! Não li. Devorei! 
       Com o tempo, as mudanças de casa, estado, etc; restou-me apenas um deles, da trilogia Winnetou, que eu mais gostei; na verdade, amei! Na trilogia, o autor narra aventuras maravilhosas de um cacique apache, um herói fictício, nativo americano. Lendo, interesse, amor e respeito nasceram, dentro de mim, pelos povos indígenas. Nisto, uma tristeza: conheci um pouco sobre a realidade dos índios americanos antes de conhecer a dos nossos índios brasileiros. Sobre estes, na escola aprendia que moravam em ocas, caçavam, pescavam, usavam cocar com penas e viviam no mato, felizes, cuidando da natureza. Bah! Entrei na escola em 1964 e todo meu período de escolarização se deu durante a ditadura; isto explica...
         Segui devorando livros, frequentando a biblioteca da escola e do município. Mas o meu desejo era comprar livros, os meus livros! Queria tê-los em casa! 
              Comecei a trabalhar concomitante à entrada na faculdade, no curso de Letras. Bah! Agora estava com  a faca e o queijo na mão! Eu tinha quem conhecia, amava e  indicava os livros (os professores de literatura: Deonísio e Alberi) e tinha o "meu dinheiro" para comprá-los!!!!! Não esqueço que, na época, além dos livros indicados pelos profes, adquiri, aos poucos, durante meses, uma coleção, linda, dos Clássicos da Literatura Universal, lançada pela Abril Cultural, entre 1978,1979. Ah! Era uma alegria infinita receber, mensalmente, um volume. Eu me sentia rica! E assim continuo sentindo: enriquecer a cada livro que compro, ganho, leio ou presenteio alguém.
         Cada livro, um mundo! Vivo!  E quando a gente retoma, como agora estou fazendo, relendo as Vinhas da Ira, de John Steinbeck, mundos, personagens e histórias dialogam comigo e se atualizam, como se também eles continuassem vivendo... tem como não gostar?!

            


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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