Inquieta, curiosa

Adolescente, gostava de sentar no alto da escada externa, apoiar-se na parede com o caderno na mão. Ali estava o sol que abraçava amoroso, gentil. Dali contemplava o céu, as nuvens passeadeiras, o movimento da brisa, as pessoas que passavam na rua, os verdes das árvores... e tudo falava, inspirava, mexia e sensibilizava... Sozinha observava o que se passava dentro... alternando tarefas escolares com registros de sonhos e “viagens”; observações do cotidiano e emoções, tão intensas,  belas e inusitadas quanto o calor do sol e os desenhos que as nuvens faziam no céu azul. O futuro estava longe e o espaço até ele ia sendo preenchido com estes desejos, sonhos, fantasias a respeito de como tudo seria... Agora, de repente (mas não foi assim “de repente”) está naquele futuro esperado e imaginado! E o calorzinho do sol, o movimento das folhas, as nuvens (ainda passeadeiras)  destacadas no céu azul, de hoje, recordam este tempo que passou e como foi que tudo se passou... Repentinamente, uma porção de folhas amareladas e em grupo, desprendem-se de uma árvore e suavemente, uma a uma, no seu tempo e ritmo, vão pousando no chão... Imediatamente associa as folhas que caem a tudo aquilo que não vingou, não aconteceu; morreu lentamente, envelhecendo; desgastado pelo tempo e pela espera inútil... Percebe, então, que isto produz, ainda, nostalgia intensa e que o luto não passou. Mas vai passar. Contudo, de outro lado, observa a nogueira, a ameixeira, o limoeiro, a laranjeira... lindos, fortes, vigorosos, cheios de frutos! Assim como outras plantas desenvolvendo, brotando, ali no quintal. No mesmo  processo de associação, estas, por sua vez, mostram tudo aquilo que aconteceu conforme o sonhado (nem sempre exatamente, por vezes de outro jeito e por vezes melhor e mais bonito!) e isto é bom! Maravilhoso! Maior! Que espaço este entre a adolescência e os cinqüenta e poucos! Cenário, roupagem, idade, experiências, corpo, “cabeça”, emoções, maturidade, energias diferentes  mas... alguns ingredientes mantidos, intactos, como a sede de encontrar palavras para expressar o que vê e experimenta! E, a mesma constatação de que, para algumas coisas não existem palavras. Então, quem sabe, estas coisas não devam ser traduzidas; porque não interessam a ninguém, exceto à sua alma; desde aquela época, inquieta, desassossegada e curiosa das sutilezas.

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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