Leitura de mundo

  Aprendendo, fazendo leitura de mundo na interação com o outro.

- Eu não gosto de ler, professora! É muito chato... – fala um.
- Ah! Mas eu gosto, profe! Agora vou ler dois livros, o que estou lendo em casa e este aqui, que é para a escola... – fala outro.
- Eu gosto um pouco... mas só de livros fininhos. Não gosto dos grossos... – acrescenta um terceiro.
- Ai, professora! Será que os colegas vão cuidar do meu livro? Diz pra eles cuidarem bem! – suspira a garota, com dificuldade em entregar seu livro para o Rodízio de Leitura, na sala de aula.
É um momento delicado e emocionante, este, dentro da aula de Leitura e Produção de Texto! Primeiro, escolher um livro para trazer, de casa, para o Rodízio. Depois, escolher um, entre todos, em sala de aula, para ler...
O livro exerce atração. E ninguém fica indiferente a ele. Mesmo os mais resistentes gostam de manuseá-los, olhar a capa, dar uma espiadinha nas “orelhas”, investigar as figuras, dentro... será que este livro é bom? Ou: o que será que tem aí, que faz um monte de gente gostar?
Observo que para alguns, as figuras são decisivas para a escolha; para outros, a capa; outros, ainda, o título. Aqueles que não apreciam muito, escolhem (não têm outra alternativa!) pela espessura mesmo!
Aos poucos, vou motivando e permitindo a leitura fora da sala de aula; estimulando a autonomia e a responsabilidade. Abrindo espaço para que o prazer possa entrar e varrer a associação da leitura com imobilidade e sisudez. Onde a maioria vai? Para cima da árvore, bem no meio do quintal! Lá ficam empoleirados e em silêncio, lendo... lendo... parece que há uma magia entre a árvore, os livros e as crianças. De vez em quando, a posição precisa ser trocada; aí acontece um pequeno rebuliço entre os empoleirados: falas, riso, reclamações... mas logo, a quietude e a continuidade da viagem através das páginas e da imaginação. Outros leem no balanço! Alguns entram dentro dos túneis; aninhando-se em suas paredes côncavas. Sempre próximos. Dificilmente algum se isola. Gostam de estar perto, uns dos outros. A quietude e o silêncio estão e vêm de dentro. 
Num momento de reflexão sobre a importância da leitura na vida de cada um; falei sobre o valor de nos dedicarmos também à leitura do mundo. Olharam para mim com outro olhar! Ficaram interessados. Expliquei que era uma leitura diferente. De coisas que não estavam escritas com letras; mas diante de nós o tempo todo; esperando nosso olhar, nossa atenção e decodificação.
Eu precisava de exemplos e recordei os que mais me aprazem: a natureza e suas criaturas e, as pessoas! Falei que aprecio e me encanto com as singularidades e com as histórias que leio e aprendo, por onde ando; que gosto de ler o que vai nos olhos e nos gestos do outro... ler e observar para aprender. Não para apontar e fazer julgamentos preconceituosos, observações depreciativas. Isto porque as leituras, depois, falam de mim. Toda leitura é assim, nos remete a um encontro conosco mesmos: as de impressos e as de mundo! Porque tudo repercute dentro da gente e produz efeitos. 
As leituras de mundo nos ensinam mais rapidamente, se praticamos com afinco: respeito, maturidade; nos colocarmos no lugar do outro; tolerância, humildade, criticidade, autonomia de pensamento; gentileza, sensibilidade, sutileza e humor! Quanto mais nos dedicamos e desenvolvemos o hábito de ler o mundo que nos rodeia, menos arrogantes, impulsivos e egoístas nos tornamos. Mais abertos à escuta, ao diálogo, à conciliação e implicados com o coletivo e com a justeza na ordem, na distribuição e gerência dos bens comuns; seja onde for.
Fiquei contente com a acolhida dos meus ouvintes e acredito que faremos, juntos, boas experiências e aprendizados; tanto nas leituras dos livros, quando do mundo. O coração palpita!!!
   Os livros também estão cativando a pequena...

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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