"Vou ser prefeita"!

          


                  Era sábado. Um dia anterior às eleições. Como geralmente fazemos quando o dia está bom; pela manhã,  eu e minha neta fomos dar um passeio na quadra em frente de casa. Vamos conversando, olhando aqui e ali... flores, passarinhos, carros, gente e sujeira! Sempre levo uma sacola para recolher o lixo que foi descartado, sem dó nem peso na consciência, por “ninguém sabe quem”, na rua.
        - “Gente que não cuida, né vovó?! Não sabem que lixo tem que ir no lixo”...
        Neste dia, a rotina foi diferente. Houvera um aniversário na escola e ela ganhara, de lembrancinha, um bloquinho e um lápis. Pediu para levar junto, menos o lápis, que trocou pela caneta do vovô. Fiquei imaginando o que faria... logo descobri. A cada lixo encontrado: papel de bala, sacola plástica, garrafa de cerveja, caixinha de suco, canudinho, bituca de cigarro, copos plásticos, ela expressava uma indignação e registrava o objeto no caderninho...
        - “Vou mostrar tudo pro tio, vó e, pro prefeito”... (neste ano a política entrou na vida dela; um tio era candidato a vereador e ela torceu e vibrou muito com esta novidade!). “Eles têm que fazer alguma coisa, vovó” ...
        E aí foi em frente, gesticulando, curiosando, descobrindo  as “porquices”; reclamando e apontado para que eu recolhesse enquanto ela fazia as anotações. Naquele momento ela não podia ajudar a recolher, tinha que anotar tudinho....
        De repente falou:
        - “Eu vou ser prefeita, vovó”!
       No domingo, enquanto caminhava em direção à seção eleitoral, para votar, lembrei do fato. Estava desanimada, com a sensação vexatória da repetição por repetição; de perda de tempo, de ser uma palhaça, babaca, etc. Senti, então, profunda saudade da emoção e do orgulho antigo em votar! Quando os ideais eram vivos e fortes; o desejo de mudança muito claro e a crença num futuro melhor, um fogo crepitante e arrebatador, dentro de mim! Senti saudade de acreditar na palavra do outro! Saudade de acreditar que o que movia os políticos, era o desejo de servir e produzir melhorias coletivas! Saudade de acreditar que aqueles em quem eu depositava meu voto, eram os\as melhores sujeitos! Saudade de acreditar no amor dos brasileiros ao Brasil! Saudade de acreditar na paz, no entendimento, no respeito e na justiça; pelas quais grandes homens e mulheres, que admiro, famosos ou anônimos, deram a vida! Saudade de assinalar um X ou clicar um nome, um número, com orgulho!
        Recordei o brilho no olho da minha neta! O seu interesse livre de interesse; o seu importar-se; sua indignação; sua rápida articulação para resolver algo que ela, aos quatro anos já sabe que é um “baita” problema; mas ainda sem noção do quanto pode ser difícil ou impossível, no mundo dos adultos (adultos? Ah! Me desculpem! Por vezes, adultos só na idade e tamanho! Há muita infantilidade permeando este nosso ser e fazer adulto, na verdade!), resolver coisas tão simples e vitais, porque ali, o interesse é cheio de interesses e não sobra tempo para cuidar das cidades e do povo que mora nelas, de fato e simplesmente!

        Então meu coração enterneceu! E de novo o "milagre": o renascimento da fênix! Ah! Sim, as crianças produzem, na gente, este reencantamento pela vida e por aquilo que parece que está morto e não tem mais jeito! Por isto, o saber de um, deve, precisa juntar-se ao saber do outro a fim de construir algo melhor para o presente e para o futuro...  Ai! Que cansaço das discussões vazias, das hipocrisias; da propagação e compartilhamento de raivas, meias verdades e até inverdades sem reflexão, sem investigação, sem ética; sem cuidado com os ouvidos das crianças, que absorvem e reproduzem tudo sem compreender... cansada da falta de respeito até mesmo e principalmente destes que cobram respeito.  Senti que meu rosto corou e o coração acelerou!!! Por ela, minha neta, eu resgatei o brio! Eu pisei firme! Ergui a cabeça! Por ela, pelos alunos! Por outros e outras e por tantas lutas que já houveram em nome desta causa! Por mim... E exerci meu direito de votar; reafirmando o compromisso comigo mesma de não desistir! Ainda há muito que fazer! E é preciso ajudar quem quer fazer, também! As pessoas acabam se encontrando; o “universo conspira”! Devagar, com respeito, muita conversa e escuta, parceria; a gente consegue (tem que conseguir!) construir uma outra estrada! Os pequenos estão vindo aí para cobrar, ajudar a repensar, motivar, fortalecer. 
       


 

2 comentários:

Unknown disse...

Coisa linda !!!!!!!!
Parabéns !!!!!!
Grande abraço ......
Cuti.

Maisa Schmitz disse...

Obrigada, querido mano!


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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