Equinócio de outono


      As palavras marcam e eu me sinto tatuada por uma infinitude delas, em todo corpo, nos sentidos e na alma. “Equinócio” veleja no meu imaginário desde a infância. Foram alguns anos para compreender seu real significado e para desvincular a palavra de um envoltório mágico. Ao que não se compreende ou não se consegue nomear, atribui-se um significado fantástico!
O interessante é que acessar ao conhecimento nem sempre elimina o fantástico; acresce! A natureza, a organização e a interligação das coisas, dos astros, dos elementos, das criaturas e de tudo isto que nos constitui e rodeia, não cabem na caixinha de definições, conceitos e comprovações científicas. Extravasam! De tão fantásticas! Surpreendentes!
Coisa mais linda as mudanças de estações que, por sua vez, provocam mudanças, alterações em todas as criaturas, na ordem e no movimento de tudo que existe... é apaixonante! Impossível não ver, não sentir.
Hoje vivemos o equinócio do outono, fenômeno astronômico que marca o início da primavera, no hemisfério norte e do outono, aqui, no hemisfério sul. Civilizações antigas consideravam este momento muito especial e comemoravam com celebrações diversas; atribuindo ao fato, significados que iam muito além das mudanças climáticas e da paisagem. Para muitos, um momento de equilíbrio entre as forças da luz e das trevas. Outros associavam o momento à colheita: de alimentos e, subjetivamente, das escolhas e atitudes.
Hoje, alguns ainda creem que o outono seja um tempo de interiorização e preparo para iniciar novos projetos, repensar outros. Um tempo de mudança. A queda das folhas e o amadurecimento de vegetais e frutos ilustrariam isto. Um tempo de delicada melancolia e também de grande beleza e inspiração.
Não fico indiferente a tudo isto. Nasci no outono e me identifico com suas características e metáforas. Quando era criança, observava, com admiração, as folhas que se desprendiam das árvores e o efeito que seu colorido produzia cobrindo as calçadas próximas de casa... eu me deleitava caminhando sobre elas e vendo-as rodopiar, feito pequenos redemoinhos, pelas ruas, ao ritmo do vento... para mim, era pura magia! Não entendia como as árvores, despidas das folhas, não morriam... tinha pena de vê-las “sem roupas”; embora isto permitisse uma observação e um encantamento maior diante de suas belas e singulares formas.
Anos mais tarde, acompanhei, com emoção renovada, minha filha, pequenina, também se deliciando, pisando e correndo feliz, sobre as folhas amareladas, tentando pegá-las quando o vento chegava fazendo alvoroço... nas mesmas calçadas e ruas... Ah! Saudade! Tempo especial!
Há poucos meses atrás, visitando meu filho e minha nora, no Canadá, eu encontrei com um outono deslumbrante! Como eu nunca vira e que arrancou suspiros fundos e encantamento ainda intraduzível; este que acontece quando, dentro da gente, unem-se, pulsantes: o conhecido, o desconhecido, o real e o imaginário; o passado e o presente. Quando é a essência que aparece e fala e não, a aparência.
        De acordo com a “teoria dos setênios”, estou na fase de vida onde a interiorização e a busca pela essência é primordial. Onde o interno passa a ter mais importância que o externo. Acho isto perfeitamente de acordo com o outono! Também me sinto assim, outonal! Um pouco árvore que acarinha o que aprendeu, conseguiu construir e a experiência que armazenou; que grata, lenta e amorosamente vai se desprendendo das folhas; consciente dos limites, do tempo que passou, do que não foi possível, daquilo que não é mais e me preparando para o novo, um novo aprendizado; uma nova “folhagem” que ainda não sei como será; mas que eu quero e posso ter\ser!
É a vida que continua e merece ser respeitada, exaltada e celebrada neste equinócio! Bem-vindo, mais uma vez, querido e "velho" amigo outono!



 

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