Um pouquinho mais...


- “Vamos caminhar em silêncio... – disse o padre. A Sexta-feira da Paixão nos remeter a isto: reflexão”.
E a procissão seguiu, silenciosa. À frente, atrás, ao meu lado, gente e gente. Uma caminhada individual e coletiva, ao mesmo tempo. Eu pensava e tentava capturar o que nos ligava, ali. Não era a fé. Fé é algo muito pessoal, muito. Eu não me atrevo a falar de fé. É delicado e íntimo demais.
Há uns cinqüenta metros da igreja onde estávamos; hoje, Sexta-feira Santa, aconteceu que, de manhãzinha, um homem suicidou-se, jogando-se do prédio onde morava. Delicado demais, isto. E forte. Não dá para dizer nada.
Eu observava o povo caminhando. Eu, parte deste povo. Eu, povo caminhando, pensando que talvez o que nos ligasse, ali, fosse o desejo de PERTENCER. De fazer parte de algo e de estar junto num laço: o de nos importarmos com isto, com este ensinamento de UM  GRANDE  AMOR;  de pertencer a uma grande família, cujo PAI nos ama e acolhe infinita, indistinta e incansavelmente... Caminhava e pensava que talvez, ao decidir saltar para os braços do vazio, não faltasse, ao suicida, fé; mas sim, esta certeza ou sensação de pertencer; de estar acolhido, encaixado em algum lugar; num abraço, num olhar, numa palavra, num contexto; num importar-se de alguém....
E de amor, eu falo! Amor eu canto! Testemunho! É delicado, mas é de outra ordem. Tem a ver com o outro. Um outro que eu vejo, que me toca, faz demandas, provoca, desafia, convoca, seduz, machuca, incentiva... Por aí entendo melhor e curto a Páscoa; pelo viés do amor! Muito mais do que pelo viés da fé. Com todas as suas controvérsias.
E sem a pretensão de estar com a verdade. Aliás, fiz uma grande e bela descoberta, também na Sexta-feira Santa: não sou dona de verdade nenhuma! Não comprei, não aluguei, não ganhei, não achei... De “verdade”, eu tenho me assustado muito quando encontro um “dono da verdade”; inclusive comigo; quando me flagro neste lugar. "Donos da Verdade" não se mostram legais e nem amorosos. Oprimem e machucam as gentes com a aspereza da sua arrogância, da sua secura e da sua ignorância. Não sabem tudo de tudo. E nem sabem o quanto não sabem.
Ah! Eu me encaixo bem é neste “ninho”(cesta) de Páscoa; ali onde tem doçuras, tem carinho, tem borda, aconchego e pertença. Isto parece fácil e piegas e fútil. Mas só parece. Porque na versão original, a gente tem que procurar a cesta (o ninho). Às vezes está bem diante do nariz. Por vezes, mais difícil. Nesta procura, nem todos têm paciência e tempo. Sem contar os que trapaceiam, dificultam, roubam ou impedem que alguém encontre a sua cesta, o seu ninho; o seu lugar.
Amo as metáforas! São “ninhos” que aprecio encontrar e onde me aconchegar. E amo a Páscoa! Estas manhãs que renascem esperançosas de mudanças e de entrega à ternura e a um olhar ao redor!
Sim, concordo! Caminhar em silêncio. Ou pelo menos, falar menos; olhar fundo, além das superfícies. Parece que ali, um pouquinho mais além... o caminho é tranquilo e está cheio de coisas deliciosas para ver e degustar! Junto e separado, como a gente escolher, a cada momento.

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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