Dor e respeito

A morte coloca o ponto final definitivo e cruel. Ela ceifa, corta, acaba com algo aqui, sem dar a mínima importância ao que se passa, para  a entrada em algo que não se conhece ou para o que cada um imagina, crê, espera. Podemos não querer e nos rebelar, mas temos que nos curvar e mais dia, menos dia, aceitar. Não tem jeito, não tem saída. Uma lei que nos governa, atua firme e que com menos ou mais dor, se faz respeitar. O contato próximo com a morte que veio e levou um familiar querido, muito querido, está me fazendo sentir e pensar muito e muito não sobre a dor, mas sobre o respeito. A dor provocada pela morte é dilacerante porque impotente, mas a gente se curva, porque simplesmente não há o que se possa fazer. Ela percorre todos os caminhos e espaços dentro da gente e depois se resume e se  aloja em algum lugar, cercada de  saudade e respeito. A dor provocada pelo desrespeito não tem sossego, a gente não consegue se curvar, aceitar, compreender. Respeito. Do latim “respectus” "ação de olhar para trás; consideração, respeito, atenção, conta; asilo, acolhida, refúgio”... Em todo lugar, de quando em quando, uma atitude desrespeitosa assombra, magoa, apaga o brilho, destrói algo, alguém. Quanto cada um de nós tem necessitado de atenção, acolhida, refúgio e não tem encontrado... quanto cada um neste mundo desrespeitoso tem penado na solidão e ali gestado fragilidades, delicadezas, aprendizados ou alimentado ressentimentos e arquitetado vinganças... Aprendi, quando pequena, que respeitar era obedecer. Obedeci sempre e me considerava respeitosa. Equívoco. Vivendo, aprende-se que respeitar está muito além do que simplesmente obedecer. Invadir, impor, humilhar, banalizar, provocar, debochar, segregar, rotular, mentir, roubar, abusar, ironizar, agredir, ofender, fofocar, constranger, explorar, expor, pressionar,  matar... é desrespeito! Em um ou outro momento, todos fazemos isto ou aquilo, com maior ou menor consciência, intenção, premeditação ou conseqüências. Percebo e compreendo que respeitar é a coisa mais difícil de aprender e viver! E que antes de amar, é preciso aprender a respeitar! Se a gente respeita, já ama! Impossível amar sem antes respeitar! Povos não teriam sido dizimados, o meio ambiente não estaria ameaçado; as cidades não estariam inflando de gente, de carros,  de  injustiças, abandonos, guerras, fome, miséria, preconceito, violência... Não estaríamos amedrontados, horrorizados, acuados, indignados e desesperançados, perdendo nossos queridos precoce e indignamente, se soubéssemos respeitar! O respeito ou o desrespeito estão dentro de todos nós. O desrespeito não está só naqueles que nos ameaçam ou prejudicam. Se houvesse respeito, haveria paz. Por isto não há paz. Nunca haverá. Nem dentro e nem fora, enquanto não amadurecermos e aprendermos a respeitar. “Não é preciso, nem obrigatório gostar, porque isto é do coração,  mas é preciso, sim, respeitar; isto é obrigatório”...  acredito nisto e repito a mim mesma e aos meus alunos, todos os dias!  Respeitar o outro, seu jeito, seu tempo e seu espaço, o direito do outro; sem desrespeitar o meu jeito, meu tempo e meu espaço, meu direito. Ideais filosóficos, ensinamentos religiosos; dogmas, leis.. tudo vazio de sentido, mero palavreado bonito ou assustador se não está calcado no respeito... que se deveria aprender, recebendo e exercitando, desde pequenino, em casa, já no berço. O respeito que a gente quer e merece, a gente tem que forjar dentro e fora, o tempo todo, a vida toda... E ali, para quem quisesse ver, no final da tarde melancólica, cheia de incógnitas e silêncios, antes do nosso querido descer à sepultura, o céu abriu! A luz maravilhosa do dia nos abraçou e bandos de pássaros livres e cantantes, suave e respeitosamente,  sobrevoaram o lugar onde estávamos rezando. Nosso querido já estava livre!  E a esperança, para nós, renascia das cinzas. Agora é cuidar dela, com profundo respeito. E, por acréscimo, aprender e aprofundar o amor. Fazer um canto de paz.

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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