Duas avós: pura ternura!

- “Agora, conta uma “hitorinha”, vovó”!
E lá foi ela, na estante, escolhendo uma “penca” de livros, esparramando-os pelo sofá, para só então selecionar aqueles do interesse do momento e, entre estes,  o primeiro a ser lido.
- “Quero este, vovó, do Rei “Leião””!
Larguei meus trabalhos e sem a menor resistência, sentei ao seu lado, no sofá e li a história, que também gosto muito. A pequena sempre fica mexida com o enredo: este tio que não gosta do sobrinho; os “leiõezinhos” (como ela fala) teimosos e curiosos que desobedecem os pais e se colocam em perigo; o “leiãozinho” que foge, cresce longe de casa... depois reencontra a amiga de infância; retorna ao lar; luta com tio e assume o seu lugar de rei e depois se torna, por sua vez, o papai de um outro “leiãozinho”... e disto ela gosta muito, vibra: do filhinho ou filhinha que tem um papai e uma mamãe! Fica feliz! Depois, não pediu para repetir a história; escolheu outra. Uma que ela não conhecia, ainda: “Era uma vez duas avós”... Meu coração bateu forte porque eu amo esta historia da Naumim Aizen! Fui lendo e ela cada vez mais centrada, interessada. Não dei conta de conter a emoção e ela percebeu; surpreendeu-se, virou-se para mim e perguntou:
- “Por que ta chorando, vovó”?
- É porque eu gosto muito desta história! Sabia que a gente pode chorar por causa de uma coisa que gosta? A gente gosta tanto, que chora de alegria, ou porque sente uma coisa muito grande, muito bonita, no coração... – respondi; sem certeza de que me entendia.
Ela voltou a atenção para o livro e pediu para que eu continuasse lendo...  No final, pediu:
- “Eu gostei desta “hitória”, vovó! Conta de novo”!
        No texto, a autora fala das suas duas avós, das diferenças e semelhanças entre elas e, do quanto marcaram sua vida, com seus jeitos singulares. Linda demais a leitura que  a neta fez das duas avós; não só do que elas exteriorizavam, mas daquilo que ela interpretava, intuía, capturava nas entrelinhas das falas, atitudes, hábitos das duas... Fundo, fundo demais! Não há como não se envolver, emocionar!
        Em outros momentos; anos passados, quando li este ímpar e belo texto, sempre lembrei das minhas duas avós, suas especialidades e do quanto guardei de cada uma delas. Hoje, pela primeira vez lendo para minha neta, foi muito mais do que isto! Eu lia e as imagens das minhas avós misturaram-se comigo; porque agora, eu sou a avó! E senti, como nunca, a urgência da essencialidade! Existem, sim, coisas impostergáveis, que não voltam ou não se repetem nunca mais e, perdê-las é imensurável. Nada podia ser mais importante do que o momento presente, ali, com ela: ora brincando junto, de massinha;  ora lendo pra ela; ora recortando e ajudando com a cola; ora ficando muito quieta, observando e fazendo de conta que trabalhava em minhas coisas e não prestava atenção ao que ela fazia: experimentando, tentando, persistente, manusear a tesoura; “rabiscando” a folha; misturando as cores das massinhas... de repente dando uma atenção “às filhas” ali ao lado... depois retomando um sem fim de “coisiquinhas” que se pode imaginar e fazer com papel, cola, tesoura e lápis, sem que ninguém interfira... até que:
        -“Vovó, senta comigo, aqui no chão... vem brincar comigo”! – um pedido tranqüilo para interagir, partilhar o momento.
Entendo. Ela descobre que tem coisas boas de fazer sozinha, mas outras, é muito melhor com o outro! Criança tem mais sensibilidade e sinceridade para reconhecer e lidar com isto. E expressar.
Num rápido instante, tentando fazer consciência de mim mesma; vasculhei meu interior para ver se haveria uma única coisa sequer que fosse mais importante do que sentar ali, com ela e brincar. Não havia. Nada.
        Mas preciso admitir que se isto estivesse acontecendo  há alguns anos atrás; talvez eu encontrasse algo mais urgente a fazer, naquele momento... algo relacionado ao trabalho ou à casa... que dor!
        Eu reaprendo. Eu me liberto. Eu me permito. Eu me  humanizo  e  me  reinvento  com minha neta. Meu coração transborda de gratidão: pelas duas avós que tive e pelo presente de ser, nesta vida, mulhermãeavó!



 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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