"Preguiçosa"




Depois de muito tempo, reencontrei com minha prima e sua família, fazendo uma visita a eles, em Floripa. Reencontrar uma pessoa querida e próxima, assim como ela, parceira de infância e adolescência, é emocionante! A gente quer falar, atualizar tudo de uma vez! As palavras se atropelam; os assuntos se misturam e viajam desordenadamente.
Então, nos primeiros momentos, não prestei atenção em nada mais do que nela e nas impressões que o nosso reencontro oportunizava; recordações de tantas coisas boas da nossa cidade natal; dos nossos familiares comuns e das vivências e parcerias. Circunstâncias, caminhos singulares e a geografia nos mantiveram afastadas por muitos anos. Agora, temos esta oportunidade de partilhar novamente a vida, num outro estágio. Coisa boa!
Num momento em que levantei para entregar a cuia do chimarrão; então sim, prestei atenção na varanda linda, cheia de sol e de horizonte e foi aí, que eu a vi: a “preguiçosa”!
Não  pude acreditar! Uma “cadeira preguiçosa”! Do meu tempo de guria! Emoção funda e uma viagem fantástica e vertiginosa ao passado, à infância. Nunca mais tinha visto uma dessas! Elas faziam parte dos acessórios da casa dos meus avós, dos meus pais e dos meus tios. Era quase um objeto sagrado! O que será que aconteceu com aquela que tínhamos na casa dos meus pais? Não lembro. Parece que diluiu-se, sutil e silenciosamente, junto com o tempo e tantas outras coisas, a espera de um inusitado, como este, para ressurgir, pulsante! A última de que tenho lembrança é a que havia na casa de tios muito queridos e próximos. Era a cadeira preferida do meu tio. Só podia ser, porque não lembro de outra pessoa sentada na cadeira, se ele estivesse presente. Depois que ele faleceu, não vi mais a “preguiçosa”.
Muito nítida, agora, a imagem do meu pai, sentado na “preguiçosa” que tínhamos em casa... quieto, saboreando sua “cangibrina”; ouvindo, no rádio de pilhas, as melodias melancólicas, no final de tarde... Olhar fixado, ora no horizonte, ora nas  rachaduras do piso avermelhado, que brilhava como um espelho, graças ao capricho da mãe... imagino que aquelas rachaduras no piso eram como estradas, por onde ele voltava ao passado longínquo; o que fazia seus olhos lacrimejarem ou, por onde se permitia aventurar ao futuro, sonhando com as suas “imaginações não comprovadas”.
Quando o pai não estava; a mãe usava a cadeira. Fazia ali os seus cochilos, entregue, depois do almoço e de limpar a cozinha; com a “preguiçosa” espichada sem esforço... Mãe cochilando, relaxada, tranqüila, serena, silenciosa e sorrindo! Sorrindo e sonhando! Processando a dureza e a frieza da lida cotidiana. E sim, sonhando com delicadezas, levezas e tantas possibilidades que ficaram no passado... eu gostava de observá-la neste “recreio”. Ah! Delícia de descanso! Magia depois do almoço... um soninho que sempre apreciei no cotidiano dos outros, mas que nunca experimentei!
Mas a nossa “preguiçosa”, eu curti, claro! Às vezes que sentei e deitei na “preguiçosa”, foram especiais. Não era uma cadeira qualquer, até porque era pesado abrí-la. Era coisa de adultos. Como toda criança, tinha admiração e curiosidade em relação ao  mundo adulto. Acessar a algumas coisas deste mundo, era o máximo! Eu gostava daquela magia de movimentar a cadeira: sentar e deitar;  baixar e levantar! Acho que também sonhei muitos sonhos, ali, contemplando os verdes, o céu, as pessoas que passavam na rua (imaginando suas histórias...), a chuva, as noites estreladas (quando fiz amizade com uma estrela a quem eu chamava de Paulina)...
Linda “preguiçosa”! Que de preguiçosa, não tinha nada! Mas de companheira, sim! De lida e de sonho; de vida! Tão bom te rever!
Obrigada, Rosane e Fernando, por este reencontro duplo!!!!


 

2 comentários:

Unknown disse...

Lindo Maisa!

Adoramos.

Nós e que agradecemos a visita de vcs, foi muito bom, uma tarde ótima, temos que nos encontrar mais vezes com mais tempo.

Bjs

Rosane

Maisa Schmitz disse...

Mais uma vez: obrigada, Rosane!!!


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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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