Amores

                       
           









     Há amores que o tempo vai acomodando dentro da  gente e ali permanecem tranqüilos, inesquecíveis mas sem arroubos e necessidades. Encaixados e em paz. Assim, há tempos deixei de vibrar como vibrava quando criança e adolescente, vendo e torcendo pelo meu Inter. Sim, O Inter era nosso! Como  um parente próximo, querido!
      Não freqüentávamos os estádios, mas acompanhávamos as narrativas dos jogos realizados na capital ou em outras cidades, pelo rádio e depois, quando chegou a TV, pela telinha. Eram momentos de grande tensão e emoção! Coração e gritos e pulos de alegria e de raiva sempre prestes a explodir... Naqueles dias, meu pai tinha uma rural e quando ocorriam as vitórias, saíamos de casa, após o jogo, para participar de passeata no centro da cidade; identificados com a nossa cor e o nosso amor: camisetas, bandeira, chaveirinhos, decalques (hoje, este universo ampliou e os símbolos dos times estão impressos em inimagináveis artigos de consumo)... Eu ia segurando a bandeira, numa das janelas e meus irmãos iam batendo tampas de panelas; gritando... e o pai, conduzindo a velha rural e buzinando sua alegria, sua satisfação e seu orgulho! Era um ritual. Era amor. Era celebração genuína! Uma felicidade ímpar, que perdurava durante a semana; servindo de motivação para todas as demais coisas da vida. O nosso era o melhor time! Tínhamos os  melhores jogadores, o melhor técnico! Ah! E as melhores jogadas, defesas! Paixão colorada!
      Mas eu, uma colorada, casei com um gremista! Um arrebatado e dos mais apaixonados gremistas! Destes que todo dia fala do seu time e está sempre, inverno ou verão, com um símbolo gremista à mão; numa camiseta, boné, casaco, cachecol... Um encontro amoroso que aconteceu na tenra infância (em Entre Rios, pertencente, na época, ao município de Nova Prata\RS); quando, menino, escutava os jogos, em pé, em cima de uma cadeira, ouvido grudado no rádio da família.
         Numa viagem recente, vi a extensão deste amor; que é fundo, incondicional. Por todo canto, com sol, chuva, névoa, frio, vento... lá ia o cachecol no pescoço, a camiseta e o casaco no corpo... lá ia o "Grêmio", atrás de um iceberg; percorrer uma trilha, conhecer um fiorde, jantar num restaurante, visitar um museu, um parque... era um orgulho, para ele, ostentar aquela cor, aquele símbolo... levá-los para bem adiante e para bem alto, inclusive na montanha com neve e com risco... para todo mundo ver! Impossível não admirar, surpreender com tamanho encantamento!
         Impossível também dizer que meu coração não acelera quando fico sabendo dos feitos, gols, subidas e descidas do meu Inter, nas tabelas dos campeonatos. Mas isto não mobiliza mais do que um sorriso interno, uma vontade de saltitar, liberar uma piadinha ou amargar uma frustração de minutos. No fluir dos dias, outras coisas, outros amores, capturaram meu olhar, meu desejo, meu sentir. Por isto, posso conviver com este adversário, sem problemas neste aspecto!
      De repente, no alto da montanha fiquei pensando que seria bonito se também eu tivesse levado um cachecol do Inter e, naquelas lonjuras, oportunizar um encontro de paz e parceria entre os times rivais, na neve! Reflito e me dou conta, mais uma vez, que  bonito, mesmo, é o amor! Como cada um é tocado e se deixa tocar por ele e como expressa o que sente! E o que ele produz na vida de cada um e até onde pode nos levar...Há tantos tipos, formas, jeitos de amar, quanto possamos nos permitir sentir. Ah! Palavras seguem definindo, explicando até um determinado ponto.... a partir dali, somente o horizonte, o azul, a música e o silêncio preenchido podem seguir... e já é um outro jeito de amar...!


 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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