"Vamos ver a Florence, mãe"...

     
      Vamos ver a Florence, mãe. Eu devia conhecer a Florence? Acho que sim, pela intimidade com que meus filhos trataram do assunto. Fiquei pensando nisto depois que despedi-me deles, que partiram para o Rock in Rio, num  sábado, há uns três anos atrás... 
      Na época, eu não sabia quem era a Florence. Agora eu sei.  Semana passada eu a vi e ouvi cantando, então lembrei do episódio... De um jeito ou de outro, as coisas sempre retornam, para um acerto, uma nova chance, um aprofundamento...
Devo culpar-me por esta ignorância acerca de tantas  coisas que fazem parte do mundo dos meus filhos? Tenho ouvido dizer que pais que “sabem tudo”, têm resposta para tudo, impedem os filhos viverem a alegria da descoberta e, consequentemente, de se encantar pela vida e ser feliz...
Gosto de observá-los sozinhos e também juntos. Adultos. Tão diferentes nas habilidades e profissões e, ao mesmo tempo tão próximos no que se refere ao lazer, arte, música, leituras, posicionamentos, jeito de encarar o mundo. Observo suas conversas; o mundo é uma cidadezinha para eles; cujas pequenas distâncias são vencidas com um aparelhinho de alta tecnologia, manuseado com um toque de dedos e com o inglês. Tudo muito simples e prático. Para eles. Não para mim. Muitas vezes me sinto uma mulher das cavernas e uma  intrusa, querendo participar, opinar sobre algo que não sei ou sei muito pouco. Mas eles são generosos. Olham para mim com aquele olhar benevolente e com paciência vão explicando: “tá bom, mãe, isto é assim... Esta cantora, você não conhece, mas ela... É fácil mexer neste aparelho, é só... Esta série que a gente está assistindo trata”... Muitas e muitas  coisas aprendo com eles. É tão bom! Sou grata. Outras, não quero aprender, não tenho paciência, nem interesse. Mas gosto de vê-los aprendendo e vivendo uma vida diferente da minha, cidadãos do mundo e não só de um pequeno mundo, como o meu.
Esta distância entre a mãe e os filhos, que avançam, é um vazio doido e doído. Começa, como todos dizem (e é verdade!), quando eles saem do nosso ventre para o mundo; quando aquela sensação de inteireza com o universo, plena, única, produzida por esta simbiose  com o ser que cresce dentro da gente, é quebrada. E nunca mais volta. E eles nunca mais voltam, de fato. Cada dia, vão um pouco para mais longe. E o silêncio, nos ambientes da casa e nos nossos braços, gradativamente vai aumentando e vamos nos partindo; pedaços que vão para lá e outros para mais além, junto com eles. Este é o exercício cotidiano de mãe; tentar, inutilmente, juntar pedaços; que já são outros inteiros por aí. E aceitar este movimento grandioso da vida. Belo. Por isto tão difícil, como aliás, são todas as conquistas e produções bonitas, boas e verdadeiras: difíceis.
Quando eles chegam em casa, para um encontro, uma visita, um colo; tudo o que conta, é que cabem exatamente no abraço da gente, junto com todas suas coisas, como sempre couberam, desde bebês. A  linguagem do afeto não precisa de tradução, explicação. Este é um lugar de pra sempre. O  nosso lugar e para onde sempre podemos voltar e sermos NÓS novamente.

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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