142 - Quedas

         Num tempo atrás, havia uma grande árvore em frente ao prédio onde morava. Ela realmente bela, frondosa e abrigava uma imensidade de pássaros que à tardinha voltavam para casa, para descansar, repousar e faziam, neste movimento, uma cantoria sem fim; relatos de um dia bem vivido. De manhãzinha, o despertar era uma delícia, afinando as vozes, cantando sem parar e suavemente. Um dia cercaram o terreno, uma máquina veio e tombou a árvore! Mas ela foi valente, ela resistiu e sofreu, porque foram precisos muitos, muitos golpes para derrubá-la. Foi uma atrocidade, um roubo de felicidade. Depois disto, mudei e vi tombarem outras árvores, na casa onde moro; verdade que por motivos de segurança, porque estavam secas ou ameaçando desabar sobre pessoas, construções em dias de tempestade e ventania; mas sempre uma mesma dor observar uma vida e tantas possibilidades tombando, morrendo sem ter feito esta escolha. Quando criança, experimentei algumas quedas. “tombos”, batendo em placas de sinalização, nas ruas, porque tinha muita "fome e pressa de ler" e lia caminhando. Diferente. Ultimamente, aconteceram alguns apagões de milésimos de segundos, suficientes para me “esborrachar” no chão sem compreender coisa alguma e levantar machucada. O que se passou? Muitas e outras quedas terríveis, vividas ou observadas no decorrer do tempo... como cair do alto mais alto de sonhos, ideais elaborados ou das certezas e situações construídas ao longo dos anos. A gente se sentindo cair, às vezes lenta, às vezes num piscar de olhos, deparando-se com o chão frio e hostil de uma realidade que não tem dó, nem piedade. Por que caímos? Quem escolhe o dia, a forma, o motivo? Distração, ignorância, destino, carma, colheita? E por que repetimos? O que foi que passou desapercebido e não aprendemos? Às vezes era algo tão bonito e bom como a frondosa e dadivosa árvore! Por que acabar e morrer? E que força, teimosia e desejo de viver forte, este da árvore tombada, que deixa, ao seu redor, sementes, brotinhos que se articulam para continuar e prolongar a vida! E que força, teimosia, desejo este, dentro da gente, que se articula para renascer das cinzas, do nada que sobra e logo ali, encontrar outra possibilidade, por vezes no mesmo lugar? Isto é burrice ou é amor? Há alguém que joga com a gente, ou joga a gente nesta tabuleiro lindo, onde por vezes parece que temos opções e onde por vezes, parece que é um jogo roubado?...

 

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2023, 14o aniversário do Blog! O meu desejo, por estes tempos, é de um pouco de calma, um pouco de paciência, um pouco de doçura, de maciez, por favor! Deixar chover, dentro! Regar a alma, o coração, as proximidades, os laços, os afetos, a ternura! Um pouco de silêncio, por favor! Para prestar atenção, relaxar o corpo, afrouxar os braços para que eles se moldem num abraço!

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